segunda-feira, 31 de agosto de 2009

367 - O velho Seminário do Pareci Novo

Carlos Barreto, pesquisador especialmente dedicado à história da Igreja Católica no Vale do Caí, destaca a importância do Seminário do Pareci Novo.
O padre Amstad, que nasceu na Suíça mas viveu a sua fé no Brasil e deu inestimáveis contribuições para o progresso do país. Foi ele que criou o cooperativismo de crédito no Brasil, criou associações, revistas, introduziu a soja no Brasil e contribuiu muito para a melhoria de vida do povo nas regiões de colonização alemã.
Ele foi padre no Caí e criou na cidade o núcleo inicial do que é hoje o Hospital Sagrada Família. Mas sua atuação como sacerdote se estendia por grande parte da região do Vale do Caí, que ele percorria em lombo de burro, rezando missa e dando assistência aos fiéis em dezenas de localidades.
Há 116 anos, no dia 6 de janeiro de 1893, logo após uma missa que rezou em Santos Reis (no interior de Montenegro), ele decidiu construir um seminário no Pareci Novo. O padre Amstad pensou em aproveitar, para isto, a casa grande da fazenda de Juca Inácio Teixeria, que estava em processo de dasativação. Amstad era um visionário. Queria o nivelamento social dos povos de origem lusa, germânica e italiana. Segundo o historiador da UNISINOS Arthur Rabuski, Amstad conseguiu fazer mais pelos colonos alemães e italianos e menos pelos lusos devido à grande desigualdade econômica que existia entre os fazendeiros e seus peões.
O padre conseguiu o seu intento, transferindo o seminário que já existia no Caí, funcionando em acanhadas instalações, para o amplo prédio do Pareci Novo. E ali o seminário funcionou por cem anos.
Neste período, formaram-se centenas de sacerdotes e também pessoas que acabaram desistindo da vida sacerdotal mas contribuíram de outra forma para o desenvolvimento do estado e do país. Um bom e exemplo disto é Balduino Rambo.
O padre Balduino Rambo, natural da localidade de Morro da Manteiga, em Tupandi, foi o maior botânico que o Rio Grande do Sul já teve. Seu livro Fisionomia do Rio Grande do Sul é a mais importante obra já produzida a respeito das plantas, animais, geologia e paleontologia do estado. Foi professor da cadeira de Antropoligia na UFRGS e o idealizador do Zoológico de Sapucaia, considerado o maior do mundo.

366 - Formador de grandes líderes

Foto do centro de Pareci Novo, em 2012: o seminário é o grande conjunto de prédios situado entre o lago e a igreja
Vários dos sacerdotes formados no Seminário de Pareci Novo tornaram-se bispos, exercendo grande influência sobre os destinos da Igreja Católica brasileira. É o caso de Dom José Baréa, Dom Luis Scortegna, Dom Alonso Mello, Dom Henrique Froelich e Dom Agostinho Kist.
O Seminário de Pareci Novo teve importância fundamental para a criação da Universidade do Vale do Sinos, UNISINOS, uma das maiores e melhores instituições de ensino superior do país e do mundo. Tanto que cinco reitores desta universidade foram seus alunos. Cerca de trezentos ex-alunos tornaram-se padres ou irmãos.
Grandes empresários e profissionais das mais variadas áreas de atividade tiveram a sua formação no Seminário de Pareci. Exemplo disto são três empresários do próprio município que tiveram importante papel no desenvolvimento da floricultura. Também é notável a contribuição que ex-alunos dão a iniciativas comunitárias ajudando escolas, hospitais, orfanatos e corais.
E, por fim, cabe salientar o grande número de educadores que tiveram a sua formação no Seminário de Pareci Novo. Muitos deles estão hoje espalhados por vários municípios e estados brasileiros e se conhece até o caso de um professor, Vendelino Lorscheiter, que trabalha numa universidade do Japão.
A região deve muito da sua prosperidade a este Seminário. O irmão Theobaldo Braun, que é natural de Bela Vista, Bom Princípio, foi professor do seminário e ali iniciou a produção comercial de flores no sul do país. Não é por acaso, portanto, que Pareci Novo é hoje a capital da floricultura no Rio Grande do Sul.
Por tudo isto, o Seminário desempenhou papel fundamental no progresso do Rio Grande do Sul e o seu valor foi reconhecido com o tombamento do prédio que o padre Amstad mandou construir sob a coordenação do engenheiro Grünewald.
Com a anuência do proprietário do prédio foi iniciado, em 8 de outubro de 1999, um longo e trabalhoso processo que resultou finalmente na aprovação do Projeto de Preservação. Com a aprovação de todos os deputados presentes, a Assembléia Legislativa aprovou o projeto apresentado pelo deputado Paulo Azeredo. E, em 24 de junho de 2003, a lei foi sancionada pelo governador.

365 - O deputado de Pareci Novo

Os municípios geralmente aspiram a ter um deputado que os represente na Assembléia Legislativa. Mas, como o número de votos necessário para isto é bastante grande (hoje, algo em torno de 30 mil) torna-se difícil para um município pequeno conseguir eleger um filho da terra para representá-lo. Por isto, no Vale do Caí, apenas Montenegro tem conseguido este benefício. Atualmente o montenegrino Paulo Azeredo ocupa uma das cadeiras da assembléia. E, antes dele, outros três políticos deste mesmo município conseguiram eleger-se: Cylon Rosa, Roberto Ataíde Cardona e Hélio Alves de Oliveira.
No ano de 1946, elegeu-se deputado um cidadão residente na então vila e hoje cidade de Pareci Novo chamado Antônio José Campani. Ele, na verdade, era também montenegrino, pois naquela época Pareci Novo ainda não havia se emancipado e era um distrito do município de Montenegro.
Foi, sem dúvida, um feito notável o deste homem que conseguiu vencer uma eleição tão concorrida sendo ele morador de uma vila tão pequena. Por isto vale a pena conhecer melhor a sua história.

364 - Caixeiro-viajante

Antigamente as lojas tinhão balcões. Os funcionários das lojas, que eram conhecidos como caixeiros ou balconistas, ficavam atrás do balcão e os clientes na frente, sem acesso direto à maioria das mercadorias. O caixeiro viajante era um vendedor que visitava os comerciantes fazendo vendas por atacado. No século XIX e início do século XX, eles se deslocavam a cavalo, mula ou burro. A partir das décadas de 1920 e 1930 os animais começaram a ser substituídos por automóveis

Antônio Campani nasceu em Porto Alegre no dia 30 de maio de 1892. Ele era filho de um imigrante austríaco chamado Luis Campani, vindo da cidade de Innsbruck, que trabalhava com caixeiro viajante, percorrendo o interior do estado. Sua mãe se chamava Rosina Crusius.
Quando jovem, Antônio José Campani trabalhou como balconista na firma Sperb & Cia, ainda em Porto Alegre. Depois se tornou caixeiro-viajante, como o pai, fazendo vendas para a firma Sperb pelo interior do estado. O caixeiro-viajante (ou musterreiter, em alemão) trabalhava para atacadistas de Porto Alegre visitando os estabelecimentos comerciais do interior (especialmente os antigos armazéns ou vendas) nos quais colhia encomendas de produtos. O musterreiter viajava em lombo de burro ou de mula e os produtos encomendados eram entregues, semanas ou até meses depois, levados em carretas puxadas a boi.
Em 30 de novembro de 1912, Antônio casou-se com Anna Sibylla Junges, que era natural da localidade de Pesqueiro, situada às margens do rio Cai, no interior de Montenegro. O pai de Anna chamava-se Carlos Junges e era dono de um pequeno estaleiro, dedicando-se à fabricação dos barcos que faziam a navegação no rio Caí. Estes barcos, que serviam tanto para o transporte de cargas quanto de passageiros, eram chamados de gasolinas, pelo fato de serem movidos por motores a gasolina. Como Carlos Junges tinha o seu estaleiro na vila de Pareci Novo, Antônio Campani, depois de casado, resolveu ir morar também ali.

363 - Vendendo sementes e ajudando o hospital

Campani continuou trabalhando como musterreiter e, como era dinâmico e trabalhador, progrediu na profissão. Principalmente depois que ele passou a trabalhar com a importação de sementes selecionadas que ele adquiria em grande quantidade, vindas da Alemanha (da cidade de Erfurt), envelopava e distribuía para todo o Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Com o tempo ele deixou de lado os burros e mulas, passando a fazer suas viagens de automóvel. Primeiro um Plimouth e depois um Ford ano 40.
A venda de sementes importadas acabou por ser o seu negócio principal. Sua empresa, denominada A S Campani, foi a pioneira no Rio Grande do Sul na comercialização de sementes selecionadas. Ela prosperou chegando a dar trabalho para mais de 50 pessoas, no Pareci Novo, empregadas na tarefa de envelopar as sementes.
Viajantes como Antônio Campani nem sempre encontravam bons hotéis nas cidades por onde andavam. E, por isto, não era raro que eles tivessem de se hospedar em hospitais. E foi assim, quando hospedava-se no Hospital Sagrada Família, que Campani conheceu o doutor Bruno Cassel. Ele viu como o renomado médico caiense enfrentava dificuldades para exercer suas atividades e como eram precárias as condições do hospital da cidade. Isto ocorreu no início da década de 30. Impressionado com o trabalho abnegado que era realizado ali pelo doutor Cassel, Campani resolveu concorrer à presidência da associação que mantinha o hospital, a União Popular. Mobilizou eleitores e venceu a eleição, assumindo o cargo que exerceu por muitos anos, até 1957.
Conseguiu melhorar muito as condições do hospital, a ponto de que já em 1940 ele era considerado um dos melhores do estado. Os prédios foram ampliados com a construção de moderna cozinha, capela, asilo e a instalação de equipamento de raio X.

362 - A eleição para deputado

A capacidade de liderança e espírito público demonstrado na construção do hospital aumentou o prestígio de Antônio Campani em toda a região. Somando-se a isto a sua popularidade, obtida nas muitas andanças como musterreiter e, ainda, às suas intervenções em favor dos colonos alemães que sofreram perseguição política durante a segunda grande guerra (ele contava - para isto - com o apoio do governador Cylon Rosa, que era montenegrino), criaram-se as condições necessárias para que ele fosse indicado como candidato a deputado estadual pelo PSD.
Durante a Segunda Guerra Mundial, quando a Alemanha tornou-se inimiga do Brasil, os descententes de alemães que viviam no Brasil foram proibidos de manter contato com a sua pátria de origem e o simples fato de falar alemão podia ser encarado como um ato de traição. O que era um problema sério para muita gente da região colonial que sequer sabia falar o português. Muitos colonos alemães foram presos por causa disto e num caso extremo uma mulher grávida foi morta por agressões sofridas na cadeia, em São Leopoldo. Campani tentou intervir para libertá-la mas, neste caso, o socorro não chegou a tempo.
Na eleição realizada em 10 de janeiro de 1947, Antônio Campani se elegeu como o quinto deputado mais votado do seu partido, um dos mais importantes no estado. Ele foi deputado constituinte, ajudando a criar a nova constituição estadual no período que sucedeu a ditadura de Getúlio Vargas. Valter Jobim era o governador na época, e Eurico Gaspar Dutra presidia o país. Para eleger-se, Campani contou principalmente com os votos de Montenegro, seu município, e do Caí. Os dois únicos municípios do Vale do Caí naquela época. Mas fez votos também em outras regiões do estado, onde tinha amigos devido às suas viagens de vendedor. Fez votos até em Santa Catarina (que não foram válidos, é claro).

361 - Perdas na política e nos negócios

No pleito seguinte, realizado em 1951, Campani trocou de partido, concorrendo pela UDN (influenciado pelo ex-prefeito caiense Luiz Clóvis Kroeff). Enfrentou forte concorrência em Montenegro, onde o ex-prefeito Hélio Alves de Oliveira elegeu-se deputado pelo PL. Não conseguiu eleger-se, ficando apenas como suplente de deputado.
Esta campanha para deputado foi muito acirrada. Carlos Campani, filho mais novo do deputado, conta alguns episódios que presenciou. Em certa ocasião seu pai promovia uma reunião de campanha na Sociedade de Pareci Velho fazendo a projeção de um filme para os eleitores do lugar. Enquanto isto, adversários cortaram os aros da roda do seu carro estacionado próximo à sociedade. Os aros eram de madeira. Noutra ocasião, opositores colocaram sal dentro do radiador, o que teria causado irremediável dano ao motor, caso este fosse ligado. Mas o golpe foi descoberto antes que isto acontecesse, pois os desafetos deixaram cair sal nas imediações do carro e o radiador pode ser esvasiado e limpo antes do motor ser acionado. E aconteceu ainda que, em Montenegro, foram colocados falsos panfletos de propaganda escritos em alemão - o que era proibido - dentro do carro do candidato. Horas depois a polícia foi fazer uma inspeção no carro, atendendo a uma denúncia, e nada encontrou. Um filho do deputado, Carlos, havia encontrado os panfletos e eles foram retirados do carro antes que a polícia fizesse a sua inspeção.
Continuou com as suas atividades de empresário, no comércio de sementes. Em 1964, já com 72 anos, mas ainda bastante dinâmico, ele sofreu um grande prejuízo. Perdeu grande parte das suas economias devido à inflação galopante que ocorreu neste ano. Desgosto que talvez contribuiu para a sua morte, ocorrida em 8 de agosto daquele mesmo ano, vitimado por um infarto.
Deixou os filhos Luis Germano, Gertrudes Rosina, Ilse Brunilde, Paulo (que morreu ainda bebê) e Carlos Antônio, que seguiu a sua profissão de caixeiro-viajante.

360 - Colônias criadas no Vale do Caí

ano da criação ( iniciativa de criação ) lado do rio

1824 - São Leopoldo (imperial) esquerdo
1827 - Vigia (Martins, Kohlen-Schmied) esquerdo

1831 - emancipação de Triunfo, esquerdo

1845 - Feliz (imperial) direito

1846 - emancipação de São Leopoldo, esquerdo

1846 - Forromeco (Winter) direito
1848 - São Sebastião (Santos - Guimarães) esquerdo
1850 - Chapadão (Flores) esquerdo
1850 - Forromeco (Vellozo) direito
1853 - Forromeco (Selbach) direito
1854 - Piedade (Matias Rodrigues) direito
1855 - Nossa Senhora da Soledade (Montravel & Cia) direito
1855 - Fazenda Maratá (Moraes, Kochenburger Irm) direito
1855 - Fazenda Laranjeiras (Fagundes) direito
1855 - Fazenda Faxinal (Barão do Jacuí) direito
1856 - Paradies (Jorge Eckardt) esquerdo
1856 - Sepultura ( ) esquerdo
1856 - Cará (Guimarães, Tristão) esquerdo
1856 - Fazenda Brochier (Brochier) direito
1856 - Fazenda Pareci (Teixeira) direito
1858 - São Lourenço (Jacob Rheingantz
1858 - Nova Petrópolis (imperial) esquerdo
1858 - Temerária (Tristão) esquerdo
1860 - Escadinhas (Moraes) esquerdo
1862 - Arroio Bonito (Martins) esquerdo
1865 - Sesmaria Azevedo (Azevedo) esquerdo
1865 - Kronental (Kohlen-Schmiedt) direito
1861 - Schneiderthal (Eugênio de La Rue) esquerdo
1868 - Nova Palmira (Mig. Kerber) direito
1865 - Roncador (Reichert, Bach) esquerdo

1873 - emancipação de Montenegro, direito

1873 - Fazenda Victória Cafundó (Bastos - Gehlen) direito

1875 - emancipação de São Sebastião do Caí, esquerdo

1875 - Poço das Antas (Ely Weber & Cia) direito
1875 - Fazenda Costa da Serra (Pereira, Matzenbacher) direito
1876 - Fazenda Pereira (Pereira) direito
1878 - Linha São Pedro (Liesenfeld) direito
1880 - Piedade (Selbach) direito
1880 - Fazenda Pirajá (Peres) esquerdo
1884 - Nova Santa Cruz (diversos) direito
1885 - Campestre (Liesenfeld) direito
1890 - Sesmaria Machado (Machado) direito
1892 - Canoas (Einloft) direito

Esta pesquisa precisa ser aprofundada e corrigida. A principal base de informações utilizada foi o livro A Colonização Alemã e o Rio Grande do Sul, de Jean Roche.
Chama a atenção, por exemplo, o fato de que a primeira colonização promovida por particulares foi a de Vigia, em 1827. Provavelmente se trata da colônia de São José do Hortêncio, pois a colonização ali começou por este ano e o notável morro da Vigia (o mais alto nas imediações de São Leopoldo) situa-se junto a esta localidade.



359 - Barão:das origens à emancipação

O desenvolvimento da localidade de Barão começou com a construção da estrada Buarque de Macedo, por volta do ano de 1870. Foi por esta estrada que os colonos italianos chegados ao porto de Montenegro, se deslocaram para as antigas colônias surgidas nos municípios de Garibaldi e Bento Gonçalves. E era por ela, também, que estes imigrantes escoavam a sua produção para Porto Alegre. O engenheiro Von Holleben, durante a construção da rodovia, morou dois anos no local onde hoje se situa a cidade de barão. E, por isto, a localidade ganhou este ano.
Veio depois a estrada de ferro. Por volta de 1910 foi construida a ferrovia que ligava Porto Alegre a Caxias do Sul, passando por Montenegro, Salvavdor do Sul e Barão. Foi graças a estas estradas que Barão começou a se desenvolver. Para a ferrovia, foi inaugurada a Estação de Barão. Mas, em 10 de junho de 1979, ela acabou sendo desativada, devido às dificuldades encontradas na manutenção da ferrovia. O que veio a frear o desenvolvimento da localidade.
Tendo pertencido inicialmente ao município de Montenegro, a localidade passou a integrar Salvador do Sul quando este se emancipou, em 9 de outubro de 1963.
A primeira tentativa de emancipação baronense ocorreu em 1982 e acabou sendo frustrada por uma derrota por 700 votos de vantagem para o “Não”. O projeto de emancipação incluia no município a localidade de São Vendelino e os votos cntrários da população desta localidade (mais próxima de Bom Princípio) fez com que vencesse o não.
Os idealizadores do movimento, contudo, não se abateram e remobilizaram suas forças para a realização do grande sonho.
Em 1985, foi aberto novo processo para a realização de um plebiscito, que foi autorizado em 24 de outubro de 1986. Dois anos mais tarde, em 24 de abril, o “Sim” venceu, com 2,9 mil votos, sendo obtida a emancipação política. O primeiro prefeito foi Valério José Calliari, tendo como vice Bernardino Scuttá.
Nos primeiros anos como Município, Barão encontrou algumas dificuldades financeiras. Mas logo começaram a chegar investimentos, que, hoje, deixam a certeza de um futuro promissor para os baronenses. A cidade possui empresas que já se consagraram em seus ramos de atividades, além de uma produção primária forte.

domingo, 30 de agosto de 2009

358 - Terra de três barões

Considera-se que Barão recebeu este nome porque um nobre alemão, o Barão Luis Henrique de Holleben, foi um dos seus primeiros moradores.
Mas existe uma outra possível explicação para o nome da cidade. Há quem sustente que o nome Barão vem do Barão de Jacuí, Francisco Pedro de Abreu, também conhecido como Chico Pedro ou Moringue.
O pesquisador José Carlos Barreto defende esta hipótese baseado numa fonte respeitável: o livro Montenegro, que foi editado em 1924 e escrito pelo montenegrino Campos Neto.
Francisco Pedro de Abreu, tinha propriedade na região do atual município de Barão e é este o motivo pelo qual a localidade de Vale Suíço, no município de São Vendelino, era conhecida antigamente como Chico Pedro. Ele recebeu do imperador Dom Pedro II o título de "Barão de Jacuí" devido à sua destacada atuação na Revolução Farroupilha, na qual comandou tropas a favor do governo imperial (contra os farrapos).
Campos Neto afirmou no livro Montenegro que "O nome Barão querem uns que seja originário do barão Von Holleben, mas supomos errônea essa afirmativa. Não consta que esse titular alemão por ali residisse". Na mesma obra, Campos Neto afirma que "O Barão do Jacuí deve ter dado nome à este Distrito".
Há, portanto, dois barões vinculados à história do município. E existe ainda mais um nobre que teve influência na história baronense. Mais exatamente, com a história da localidade de Linha Francesa, no interior do município.

357 - O outro Barão

Décadas antes da vinda de von Holleben, o Conde Felice de Montravel, que era francês, fundou na região uma grande colônia, vendendo lotes de terra para imigrantes europeus. Esta colônia tinha sua sede no local onde hoje se situa a cidade de São Vendelino mas incluía terras pertencentes ao atual município de Barâo e foi através da colonização promovida pelo Conde Montravel que começou a povoação das localidades de Linha Francesa Alta e Linha Francesa Baixa.
A história de Linha Francesa é contada no excelente livro Linha Francesa, escrito pelo baronense Guido Carlos Bourscheid, no qual se percebe que a Linha Francesa é bem mais antiga do que a sede do município.
A colônia de Montravel chamou-se Santa Maria da Soledade e a sua fundação ocorreu no ano de 1855. Dois anos após, chegaram os primeiros moradores da Linha Francesa, que fazia parte da colônia. Logo que chegaram, eles já se preocuparam em criar uma pequena escola comunitária, pois os imigrantes vindos da Europa não admitiam a hipótese de deixar seus filhos sem instrução. Apesar do nome dado ao local, estes primeiros moradores são todos de origem alemã.
Conforme relata Guido Bourscheid, a primeira escola de Linha Francesa era um prédio rústico, feito de madeira serrada e preparada manualmente pelos próprios colonos. Ela estava situada na Francesa Alta, mais exatamente nas terras do falecido Dalci Wilmsen, e o início do seu funcionamento deve ter ocorrido antes de 1860. Seu primeiro professor foi Georg Bieger. Quando os colonos alemães implantavam uma nova área de colonização, costumavam escolher para professor um colono local com um pouco mais de instrução. Com o tempo se contratava um professor de fora, mais preparado. Para isto lhe era oferecida uma casa junto à escola, com área de terra suficiente para ele cultivar uma roça própria. O que lhe garantia alimento e alguma renda extra. Em Linha Francesa, como na maioria das demais comunidades que começavam, o professor também dava instrução religiosa e a escola servia para a realização de cultos.
Esta preocupação com a educação, que existiu desde o início, é uma explicação para o elevado grau de desenvolvimento que o município exibe atualmente.

356 - Porque a cidade de Barão tem este nome

O Barão Luis Henrique von Holleben
Muitas vezes nos deparamos com o nome de uma localidade e ficamos nos perguntando qual a razão de tal denominação. Tal curiosidade se justifica particularmente diante de um nome como o de Barão.
Por que motivo esta cidade, situada no nosso Vale do Caí teria recebido este nome?
Artigo publicado pelo falecido monsenhor Ruben Neis esclarece perfeitamente a questão.
O Barão de Holleben, cujo nome completo era Luis Henrique de Holleben (ou von Holleben, no nome original alemão), nasceu em Hudolstadt, no estado alemão da Turíngia. Seu nascimento se deu em 2 de dezembro de 1832 e seu pai, Karl Ludwig Anton von Holleben, era homem influente (inclusive deputado).
Luis Henrique, quando jovem, foi oficial do exércitO Fato Novo passa a circular
tes, na cidade de Barão.foto com o Cléoo prussiano. Um desentendimento com os pais e irmãos levou o jovem militar a emigrar para a Inglaterra, onde lutou, como oficial, na legião estrangeira do exército britânico: a famosa King´s German Legion (Legião Germânica do Rei).
Ainda na Inglaterra, ele casou com Ana Maria Georg. Casamento que teve pouca duração, pois Ana Maria faleceu por ocasião do seu primeiro parto, juntamente com a criança. Fato que ocorreu enquanto Luis Henrique estava no exterior, lutando na Legião Estrangeira.

355 - Von Leben no Brasil

Ainda durante a sua permanência na Inglaterra, Luis Henrique formou-se engenheiro ferroviário. Desgostoso com a morte da esposa, ele aceitou trabalhar na construção de ferrovias no exterior. Esteve inicialmente na América Central e, pelo ano de 1861, veio ao Brasil.
Até o ano de 1868 ele permaneceu no Paraná, onde casou com Maria da Luz dos Santos, em Curitiba, e trabalhou na Secretaria de Obras Públicas do Paraná. Foi responsável pela construção da ferrovia que liga Curitiba a Joinville, inaugurada em 1865.
Em 1868, Luis Henrique de Holleben transferiu-se com a família para Niterói, no Rio de Janeiro. Uma mudança infeliz, pois ali morreu sua esposa, aos 30 anos de idade, deixando-lhe dois filhos pequenos: Luis Antônio, de três anos, e Luis Alberto, com um ano e meio.
Depois disto, von Holleben foi morar na cidade de Campos, também no estado do Rio de Janeiro. E lá ela se casou com Maria de Azevedo Koch, que tinha 21 anos e foi sua companheira até a morte. Deste terceiro casamento surgiram mais cinco filhos. Em Campos von Holleben foi o engenheiro-chefe, na construção da estrada de ferro local e, em 14 de julho de 1875, coube a ele recepcionar o imperador Dom Pedro II na solenidade de lançamento da pedra fundamental na obra da estação ferroviária da cidade.
Em 1876 o barão von Holleben passou a trabalhar em obras ferroviárias no Paraná e em Santa Catarina e, em 1880, veio para o Rio Grande do Sul. Seu objetivo era trabalhar na construção da estrada de rodagem que ligaria a Colônia de Conde D’Eu (cuja sede é hoje a cidade de Garibaldi) à Colônia Dona Isabel (atual cidade de Bento Gonçalves) e também à ligação entre Garibaldi e Montenegro.
Para cuidar destas obras, o barão Luis Henrique de Holleben passou a residir numa pequena localidade situada entre as atuais cidades de Salvador do Sul e Carlos Barbosa. Quem, naquela época referia-se ao lugarejo, dizia “lá no Barão”. E foi assim que o lugar ganhou o nome, que persiste até hoje.
O Barão viveu ali por apenas dois anos, mudando-se depois para Porto Alegre, Porto Alegre e Rio Grande, sempre envolvido em obras. Ele morreu em 1894, ano em que o estado foi sacudido por uma cruel revolução. Ele era sócio de uma casa comercial que foi à ruína e o deixou endividado. Aos 62 anos, desgostoso e envergonhado, ele cometeu suicídio com um tiro na cabeça. Deixou a viúva pobre e com os cinco filhos na idade de seis a 18 anos.

354 - Pensando Grande

Nosso blog já conta com mais de 350 postagens e nele encontramos informações sobre todos os vinte municípios que integram o Vale do Caí. O blog está se tornando tão grande que aconselhamos o uso do sistema de pesquisa, digitando o assunto desejado na faixa branca existente no canto superior esquerdo desta página.
Neste momento, digitando-se (por exemplo) Capela de Santana, são destacadas imediatamente 20 postagens em que este município é citado. Se for digitada a palavra Selbach, surgem cinco postagem em que são citadas pessoas com este sobrenome.
Mas isto é apenas o início. Temos ao nosso dispor os arquivos completos do jornal Fato Novo e o acervo do Museu Histórico Vale do Cahy, além do acervo particular do historiador Renato Klein. De modo que poderemos, com o tempo, fazer milhares de postagens. Temos a possibilidade, ainda, de incluir fotos. Material em que os mesmos três arquivos são ricos. Portanto, depende apenas de tempo para que o Vale do Caí passe a contar com um dos mais ricos acervos de informações históricas encontrável na internet. E pensar que, há 30 anos, era extremamente pobre e inacessível o material disponível sobre a história da região.

353 - A família Ely


O Edifício Ely, em Porto Alegre, foi construído pelo caiense Nicolau Ely
Clique sobre as fotos para ver melhor

Catarina Ely nasceu no Brasil, no dia 12 de abril de 1831. Ela era filha do imigrante João Pedro Gaspar Ely que foi uma personalidade de destaque na comunidade caiense. Ele era filho de Jacó Ely e Maria Gertrudes Hoffmann e veio para o Brasil acompanhado da mãe e de seus irmãos João Carlos e João Nicolau. Chegou em São Leopoldo no dia 10 de maio de 1829. Seu pai morreu pouco antes da viagem imigratória.
João Pedro Gaspar Ely nasceu em Mambächel, localidade situada na Renânia-Palatinado, hoje um dos estados constituintes da Alemanha. Nasceu em 13 de janeiro de 1810. A viuva Ely e seus filhos fixaram-se na Feitoria Velha, perto de Lomba Grande.
Em 1848 os irmãos Ely ainda viviam na Feitoria e em Lomba Grande e eram mais ou menos prósperos. Pedro era proprietário de um engenho de mandioca. Mas já nesta época ele e o irmão Carlos se dedicavam à navegação no rio Caí. Eles começaram como remadores, mas já em 1844 há registros de que Pedro era proprietário de um lanchão que navegava pelo rio Caí. Com remadores, que eram seus empregados, ele percorria o rio Caí levando mercadorias e passageiros no seu lanchão.
Pedro Ely era inteligente e assimilou logo a língua portuguêsa. Ele tinha a pele morena e o cabelo crespo, o que fez com que recebesse o apelido de Pedro Preto (Schwarzer Peter) pelo qual ficou muito conhecido em toda a colônia alemã.
Pedro casou-se com Cristina Regner e, com o falecimento precoce desta, casou novamente com Catarina Elisabete Kunz. O casal viveu no Caí, onde criou seus dez filhos.
Catarina Ely, que era a filha mais velha de Pedro e Catarina, nasceu em 1831 e casou com João Klein em 18 de agosto de 1849.
Catarina Ely era irmã de Nicolau Ely, que foi tentar a vida em Porto Alegre e fez fortuna. Foi comerciante de tecidos, importador e exportador. Construiu o Edifício Ely que ainda hoje é preservado (fica próximo à estação rodoviária de Porto Alegre). O prédio é uma obra prima de arquitetura, criada pelo arquiteto alemão (radicado em Porto Alegre) The
Pedro Ely Jr (filho de João Nicolau Ely e sobrinho de Pedro Ely) foi o iniciador e agrimensor da localidade de São Sebastião do Caí, fazendo parte da primeira câmara de vereadores caiense. Foi também o criador da Picada Poço das Antas, juntamente com os irmãos Weber. Origem da atual cidade e Poço das Antas.
Um sobrinho de Catarina, chamado Jacó Nicolau Ely foi intendente de Garibaldi, delegado de polícia, juiz distrital e Coronel da Guarda Nacional, além de industrial de porte. Ele foi casado com Vitória, filha de Manuel Peterlongo, engenheiro agrícola nascido na Itália, fundador da vinícola Peterlongo.
João Klein e Catarina Ely tiveram oito filhos homens: Antônio, Matias, José, Pedro, Jacó, Guilherme, Adão e Jorge. O ex-prefeito caiense Léo Klein é bisneto de Matias Klein, neto de Guilherme Alberto Klein e filho de Edmundo Klein.

sábado, 29 de agosto de 2009

352 - As vítimas do bugre

No município de São Vendelino, ocorreu uma das histórias mais marcantes da época de colonização alemã, que foi o rapto de toda a família do colono Lamberto Versteg por índios caingangues. Os selvagens saquearam a propriedade do colono e seqüestraram sua esposa e o casal de filhos. A mulher e a filha foram mortas pelos índios e o filho, chamado Jacó, sobreviveu, conseguindo fugir e voltar à civilização branca, depois de haver permanecido por cerca de nove anos entre eles. O próprio Jacó Versteg, quando já era idoso, contou sua história ao monsenhor Matias José Gansweidt, que escreveu um livro baseado no seu relato e no de outras pessoas que participaram desta história. O livro, bastante conhecido, chama-se As Vítimas do Bugre e conta em detalhes a história que aqui apresentaremos de forma resumida.
Lamberto Versteg estava vivendo com a sua família na Colônia de Santa Maria da Soledade já há dez anos quando aconteceu o rapto de seus familiares. E os índios que cometeram o crime teriam agido por orientação de Luís Bugre, um índio que falava alemão e vivia no meio dos colonos. Luís havia sido separado da sua tribo e adotado por uma família branca, aos 11 anos de idade. A palavra bugre que os colonos usavam para identificá-lo era a forma como os índios eram tratados naquela época.
Foi no ano de 1847, na recém implantada colônia de Feliz. Cansados de serem incomodados pelos bugres (que lhes devastavam as plantações e roubavam-lhes o gado nos potreiros) os colonos se reuniram para organizar uma defesa coletiva. Os colonos João Barth, Jacó Bohn, João Berwanger, Miguel Nedel, Matias Flach, João Hentz, Pedro Hirschberger, André Scherer e Antônio Zirbes combinaram de ter sempre, em casa, uma espingarda com cartuchos carregados de sal ou de chumbinho, para dar uma recepção inesquecível aos bugres que roubavam suas criações e lavouras. As espingardas ficavam sempre prontas, do lado da cama do chefe da família, pois os índios costumavam atacar à noite. E também combinaram que, havendo o ataque a uma propriedade, os vizinhos deveriam se unir para a defesa do colono atacado.
O colono Jacó Bohn preparou um sistema de alarme bem rudimentar, mas eficiente. Uma corda foi esticada na borda da sua plantação de milho, ficando a ponta da mesma amarrada a uma lata vazia deixada sobre uma caixa, dentro da sua casa. Numa noite aparentemente tranqüila, a lata caiu de cima da caixa, acordando o colono. Dois dos seus filhos correram a avisar os vizinhos mais próximos e estes avisaram outros vizinhos, de modo que em 45 minutos já havia um grupo de colonos reunido na casa de Jacó. Todos armados com suas espingardas, os colonos cercaram a roça de milho, dentro da qual os bugres faziam a sua rapina. A um sinal, os colonos começaram a disparar suas espingardas e seus cachorros também atacaram os selvagens que foram tomados de um pânico extremo. Em fuga desesperada, os bugres correram em direção ao rio Caí e se jogaram nas suas águas, desaparecendo rapidamente.

351 - Luis Bugre

Mas um dos bugres não conseguiu fugir. Ele foi atingido por uma carga de chumbo no joelho e, na fuga, destroncou o pé. Era um menino de onze anos e um dos colonos, o luso Matias Rodrigues da Fonseca, resolveu levá-lo para sua casa, para servir de empregado. O garoto, que passou a chamar-se Luís Antônio, cresceu na convivência com os colonos e aprendeu até a falar (mal) o alemão, língua predominante na colônia. Recebeu a educação religiosa que era dada aos filhos de todos os colonos e, em 1849, foi batizado pelo padre João Sedlack, da recém constituída paróquia de São José do Hortêncio. Os padres de Hortêncio, naquela época, prestavam assistência aos colonos católicos do Vale do Caí. Eles eram alemães e tinham, portanto, facilidade de se comunicar com os colonos. Antes da vinda destes padres, os colonos católicos da região estavam mal assistidos religiosamente, pois os padres brasileiros só sabiam falar o português.
Mas Luís Antônio nunca assimilou totalmente a cultura dos brancos. Ele costumava se embrenhar na mata, onde ficava por dias, semanas ou até meses, voltando depois para a casa do “pai” Matias, trazendo peles de animais caçados por ele.
Certa vez Luís voltou trazendo uma companheira. E assim Luís Bugre, como o chamavam, passou a morar na colônia de Feliz, junto com um colono alemão chamado João Welchen que tornou-se seu companheiro de caçadas. Antônio praticava uma forma de comércio bastante comum na época, intermediando as trocas entre brancos e índios. Os seus companheiros de raça forneciam mel silvestre, peles de animais e papagaios vivos, recebendo em troca algumas “maravilhas da civilização”, como pedaços de espelho, facas de metal, açúcar e sal.
Mais tarde Luís se estabeleceu numa encosta de difícil acesso no Morro da Canastra, ao norte da atual cidade de São Vendelino. Lá ficavam sua mulher e dois filhinhos, enquanto Luís andava pela colônia e pelas matas da Serra, fazendo contato com colonos e índios. Gostava de tomar cachaça, que ganhava dos comerciantes em troca da facilitação dos negócios que estes também faziam com os bugres que ainda perambulavam pelas matas do Vale do Caí. Quando bêbado, Luís tornava-se brigão e insolente. E não suportava que o chamassem de bugre. Perambulando pela colônia, sempre acompanhado de uma “escolta” de cachorros brabos, Luís passou a inspirar medo e preocupação entre os colonos.
Aconteceu, então, o episódio narrado no livro do monsenhor Matias Gansweidt.
Vivia na Colônia de Santa Maria da Soledade uma família que havia imigrado da Alemanha em 1858: o casal Lamberto e Valfrida Versteg e seus dois filhos: Jacó e Maria Lucila. Lamberto era de uma família nobre, descendente, por parte de mãe, dos condes von Ameringen. A sua família havia empobrecido e perdido a condição de nobreza, mas ele ainda guardava algo do ar altivo herdado dos antepassados.

350 - Lamberto se estabelece na colônia

Quando Lamberto, recém imigrado, chegou a São Leopoldo, foi convencido por um agente a comprar terras na Colônia de Santa Maria da Soledade. As terras mais próximas já haviam sido vendidas e ele acabou adquirindo as suas na localidade conhecida hoje como Santo Antônio do Forromeco, situada ao norte da atual sede do município de São Vendelino, na confluência do arroio Forromeco com o seu afluente Arroio Santa Luiza. Lá as terras eram baratas, mas pouco povoadas. Os vizinhos eram poucos e moravam a uma boa distância uns dos outros.
Ali Lamberto, Valfrida e os filhos viveram sossegados por dez anos. Aos poucos iam melhorando de vida, graças ao trabalho árduo de toda a família. Seguindo o costume dos colonos alemães, até os filhos pequenos ajudavam nos trabalhos da casa e da lavoura. A colônia também se desenvolvia, a povoação pelos homens brancos aumentava, mas a preocupação com a ameaça dos bugres não havia desaparecido.
Em 1857 os selvagens haviam atacado a propriedade de Nicolau Rempel, na picada Feliz. Ele trabalhava na lavoura, quando viu os nativos se aproximarem. Correu para a sua casa, onde pretendia apanhar a sua espingarda. Enquanto corria gritava para a mulher e os filhos, dizendo para eles se esconderem no mato. Nicolau não conseguiu chegar até a sua rústica morada. Antes disto foi atingido por uma flecha e morreu.
O governo havia destacado um grupo de 30 homens que, sob o comando de Jacó Fetter, conseguiram manter os bugres à distância. Mas havia uma generalizada desconfiança com relação Luis Bugre e o temor de que ele atacasse as propriedades dos colonos juntamente com seus companheiros de raça.
Mesmo assim, em janeiro de 1868, Lamberto Verstag decidiu aceitar o convite de um velho amigo e ir visitá-lo no povoado do Caí (povoação que já havia se formado naquela época, junto ao Rio Caí, nas localidades conhecidas hoje por Bela Vista e Caí Velho, pertencentes ao município de Bom Princípio).
Valfrida ficou em casa, com os filhos Jacó, de 14 anos, e Maria Lucila, dois anos mais nova. A primeira noite passada sozinha foi de certa apreensão para Valfrida. Com o clarear do dia ela se sente mais segura. Cuida do trabalho na propriedade até que, num dado momento, chega à casa um homem de pele escura e rodeado de cães. Valfrida, mesmo sem conhecê-lo, suspeita logo que se trata do temido Luis Bugre. O homem se apresenta e fala com a mulher amavelmente, tratando de tranqüilizá-la quanto às suas intenções. E, de fato, logo Luis se despede e parte pacificamente. Valfrida prossegue no seu trabalho, apesar do temor por saber que o mal afamado bugre andava por perto. Decide ir, com os filhos, para a casa de um vizinho e lá permanecer até a volta do marido. Mas antes dela poder executar o seu plano, a família sofre o ataque dos bugres.

349 - O sequestro

Primeiro Valfrida ouviu o barulho dos quero-queros, dando o alarme. Os galos também deram o sinal. Então o cão fiel saltou de dentro de casa para o terreiro e correu, latindo furioso, em direção ao mato. Valfrida já se preocupa com estes sinais dados pelos animais, e logo vem a confirmação dos seus maus pressentimentos: uma flecha entra pela janela aberta, transpassa a casa e vai cravar-se na parede oposta, tremulante. A mãe deita no chão da casa, arrastando com ela os dois filhos. Os três se dirigem para o quarto de dormir, onde se encontra a espingarda carregada. Ela entreabre a janela e dispara um tiro na direção do mato, esperando assim espantar os bugres. Mas não é este o efeito alcançado. Os latidos furiosos do cão cessam pouco depois. Plutão, o fiel amigo da família, é atingido por uma flecha. Os bugres permanecem no mato, a espreita. O disparo da arma não os fez fugir. Eles estavam bem informados. Sabiam que ali se encontrava apenas uma senhora e seus dois filhos indefesos. Mais uma flecha penetra na casa, pela janela. Valfrida segura a espingarda de dois canos, pronta a atirar no primeiro bugre que se atrever a mostrar sua cara na janela da casa. Mas o ataque não ocorre logo. Pelo contrário, volta o silêncio e a tranqüilidade normais do lugar. Os animais voltam a emitir os sons da normalidade. Pássaros cantam na mata. A galinha choca volta a passear pelo terreiro, com seus filhinhos. Valfrida espia pela janela, pensando que os bugres haviam fugido. Mas, então, eles surgem. De todo lado, eles irrompem da mata, avançando sobre a casa aos gritos. A porta externa da casa é arrancada por violentos golpes e logo a Valfrida se vê cercada por selvagens semi-nus. Um deles lhe arranca a espingarda das mãos. Os invasores logo começam uma destruição estúpida de tudo que se encontra dentro da casa. Móveis, louças, panelas. No pátio, abatem os animais: cavalos, vacas, porcos. Destroem tudo. Voltam à casa e reviram a casa até encontrar os dois filhos que haviam se escondido debaixo da cama. E os rostos dos selvagens dão sinais de que era isto - as crianças - que eles procuravam. Os bugres agarram Jacó e Maria que gritam pela mãe, pedindo socorro. Ela corre para eles, mas recebe um murro violento desferido por um dos invasores, que a faz cair num canto da casa, sem sentidos. Quando volta a si, ela e os dois filhos estão com os pés e mãos amarrados. São prisioneiros dos índios que ainda vasculham a casa. Encontram um estojo com jóias, que o cacique pendura no próprio pescoço.
Os assaltantes preparam depois a retirada. Carregam o que podem. As facas da casa despertam especial interesse. Galinhas, porcos e vacas são mortos e esquartejados. Os selvagens atam com cordas grandes pedaços de carne, dois a dois, para carregá-los às costas. O que não podem carregar, destroem. E, para completar, acabam ateando fogo à casa de madeira. Em minutos, é destruído tudo que a família conseguiu erguer em dez anos de trabalho incansável. Valfrida e as duas crianças são levadas pelos índios, prisioneiros.
Quando Lamberto volta do Caí, se depara com a cena tenebrosa. Chocado pela ruína que encontra no lugar do seu lar e pressentindo a desgraça que se abatera sobre os seus, ele desaba. Desmaiado, tomba do seu cavalo. Voltando a si do desmaio e do desvairio inicial, Lamberto faz um levantamento da destruição e vê, pelo chão, as pegadas de muitos pés descalços. Ele, então, grita chamando pela mulher e os filhos, na esperança de que eles tenham conseguido fugir, escondendo-se no mato. Mas não ouve resposta alguma. Lamberto percorre a mata ao redor da casa procurando pela família e nada. Vai então até a casa dos vizinhos mais próximos, a família de João Boesing, mas também lá seus familiares não estão.
Logo o alarme se espalha por São Vendelino. O povo da colônia fica sabendo rapidamente que os bugres atacaram a morada de Lamberto Versteg e roubaram-lhe a mulher e os filhos. Ao toque do sino da capela, o povo se reúne e se inteira dos fatos.

348 - Buscas infrutíferas e a volta de Jacó

Foi organizado um grupo de voluntários que se prontificou a sair no encalço dos índios assaltantes, na tentativa de resgatar a mulher e as crianças por eles raptadas. A expedição partiu de São Vendelino no dia 15 de janeiro de 1868. Chamou a atenção de todos, no início da jornada, o estado de ânimo de Lamberto Versteg. Cabisbaixo, abatido pela desgraça que caíra sobre sua família, ele não parecia mais o mesmo homem de porte altivo que era antes.
Eram os seguintes os integrantes da pequena tropa:
João Felipe Scheid, Antônio Grossmann, João Beckembach, Nicolau Neis, Jacó Weirich, Henrique Esswein, Antônio Ludwig, Nicolau Lermen, Tomás Postai, João Lotermann, Matias Hendges, Xavier Boeni, Frederico Gossenheimer, Jacó Mueller, Pedro Krein, Simão Backendorf, Matias Nauls, Nicolau Binsfeld, João Ramler, Matias Scherer, Jacó Schmitt, Adão Petry, Matias Rodrigues da Fonseca, Augusto Froem, Lamberto Versteg e João Boesing. Ao todo, 26 homens.
Matias Rodrigues da Fonseca, que sabia falar alemão e tinha o hábito de embrenhar-se na mata fazendo caçadas, foi escolhido pelos membros da expedição para ser o chefe da mesma. Fato que demonstra o quanto ele era respeitado pelos colonos de Santa Maria da Soledade.
Tanto esta quanto outra expedição organizada para resgatar Valfrida, Jacó e Lucila foram mal sucedidas. Era difícil para os colonos enfrentar as agruras da selva e mais difícil ainda confrontar-se com os índios no ambiente que eles conheciam muito melhor. Além disto, a extensão das terras desabitadas que eram percorridas pelos índios na sua existência nômade tornava quase impossível a sua localização. Na segunda expedição de busca, patrocinada pelo governo, Luis Bugre ofereceu-se para participar e foi aceito devido aos seus conhecimentos da floresta e da tribo dos índios raptores. Mas tudo indica que ele procurou, ardilosamente, impedir o sucesso dos expedicionários.
Passaram-se os anos e os colonos nada souberam quanto ao destino da mãe e seus filhos. Nove anos mais tarde, Jacó Versteg apareceu de volta à civilização. Ele havia vivido com a tribo, levando uma vida de selvagem. Até que, já um rapaz adulto, com seus 23 anos, conseguiu fugir. Dirigiu-se para São Leopoldo, onde teve a sorte de encontrar seu pai. Assim Lamberto soube que tanto a esposa como a filha haviam sido mortas pelos índios.
Jacó Versteg narrou sua história pormenorizadamente para o monsenhor Matias Gansweidt, que a narrou no livro As Vítimas do Bugre. Um rico relato sobre as desventuras dos três raptados e sobre as características da floresta e dos seus primitivos habitantes.

347 - O sonho do Conde Montravel

O vale do Forromeco, espremido entre montanhas, é de uma beleza extraordinária. Lembra as paisagens européias dos Alpes. Só que aqui o que cobria a terra não era a neve, mas a vegetação luxuriante da mata atlântica, com sua incrível biodiversidade. Para quem vinha da Europa, onde já faltavam terras próprias para cultivar, o Vale do Forromeco parecia um paraíso. Na Europa, superpovoada, as terras custavam muito caro. Na província do Rio Grande do Sul, terras eram distribuidas praticamente de graça pelo governo. Os europeus, ao verem a possibilidade de tornarem-se donos de grandes extensões de terras férteis, ficavam encantados e, muitos deles, sonharam em criar aqui recantos paradisíacos nos quais poderiam viver. E uma das pessoas que entusiasmou-se com as possibilidades de colonização deste vale foi o Conde Felice de Montravel (alguns autores referem-se ao conde pelo nome de Paulo Montravel), que era vice-cônsul da França em Porto Alegre (ou no Rio de Janeiro, segundo outras fontes). Ele vinha há algum tempo propondo ao governo brasileiro a criação de uma grande colônia na qual pretendia instalar 18 mil pessoas vindas da Europa. Seu sonho era criar ali uma espécie de condado, como havia na Europa, no qual ele teria grande autoridade. Falava até em criar um exército próprio para esta colônia. Ele, certamente, acreditava que poderia fazer maravilhas transferindo um povo culto e laborioso para uma terra fértil e abundante. Em seus sonhos, imaginava que a colônia por ele criada seria um verdadeiro paraíso.
Vendo boas possibilidades de Montravel atrair colonos europeus para colonizar o pouco povoado território do Rio Grande do Sul, o Governo Imperial vendeu a ele uma extensa área (17.424 hectares) no Vale do Caí. Era muito menos do que o Conde pretendia obter inicialmente. E a área de terras que lhe foi finalmente entregues não eram as que ele inicialmente havia reivindicado. O governo havia lhe prometido uma área que seria adquirida de José Ignácio Teixeira, às margens do rio Caí (nas imediações do atual município de Harmonia), mas o que ele acabou recebendo foi a área em torno do atual município de São Vendelino. Uma área incomparavelmente mais difícil de colonizar em virtude da distância em relação ao rio Caí. Mas o governo imperial acabou oferecendo algumas compensações financeiras e o Conde aceitou a empreitada

346 - Colônia de Santa Maria da Soledade

Montravel associou-se com três investidores brasileiros: o doutor Israel Soares de Barcelos, o doutor Dionísio de Oliveira Silveiro e João Coelho Barreto. Com eles formou a firma Montravel, Silveiro & Cia e os três empreenderam a fundação d a colônia que recebeu o nome de Santa Maria da Soledade. Ela foi dividida em quatro distritos, cada uma com o nome de um dos sócios: Distrito Montravel, Distrito Barcelos, Distrito Coelho e Distrito Silveiro.
A venda desta grande área de terra foi feita sob a condição de que a empresa conseguisse atrair para ela um determinado número de colonos. O plano inicial do Conde Montravel era de buscar colonos na Suíça, e ele fazia questão de que fossem todos católicos. Seus planos neste sentido, entretanto, não deram certo e ele, para cumprir o seu compromisso com o governo imperial brasileiro, teve de buscar imigrantes em outros países da Europa, deixando de lado restrições como a de que os colonos fossem católicos. Para isto, a empresa colonizadora contratou agenciadores que faziam propaganda da nova colônia para atrair interessados em mudar-se para lá. A Prússia (região da atual Alemanha) era o principal alvo destes propagandistas, pois era grande a situação de miséria do povo prussiano na época.
Mas as dificuldades para convencer europeus a se aventurarem num mundo tão distante era grande. O número dos que vieram foi bem menor do que o esperado. Por isto, muitos colonos que compraram lotes na colônia criada por Montravel eram filhos de imigrantes alemães chegados ao Brasil no período de 1824 a 1830 e que se estabeleceram nos vales dos rios do Sinos e Cadeia. Na medida em que os filhos destes colonos cresciam e se casavam precisavam adquirir terras novas para cultivar. Naquela época, cada casal de colonos tinha muitos filhos e não era possível que todos se sustentassem trabalhando nas terras que o governo havia dado originalmente aos seus pais.

345 - Primeiros colonos

A fundação da Colônia Santa Maria da Soledade ocorreu em 6 de fevereiro de 1855 e o governo estipulou o prazo de cinco anos para que a área fosse toda colonizada. Pelo contrato, em um ano 1440 colonos já deveriam estar lá instalados. Mas, neste prazo, apenas 256 haviam se estabelecido. Os primeiros colonos a se fixarem nas terras adquiridas por Montravel teriam sido João Felipe Scheid, Antônio Kossmann, Antônio Ludwig, Nicolau Lermen e Nicolau Neis, segundo consta do livro Monografia de Montenegro, de João Cândido de Campos Netto. Outra fonte, porém, aponta como sendo os seguintes os primeiros imigrantes chegados à colônia: Adam e Cristine Mensche, com uma filha; Peter e Eva John, com dois filhos; Peter Steurnagel, com a mulher e quatro filhos; Johanes Schneucker, com esposa e um filho; Thomas Ebert, com a mulher e cinco filhos; Peter Auth, com a mulher e cinco filhos. Estes, segundo o autor Egídio Weissheimer, teriam sido os componentes da primeira leva de 30 colonos de Santa Maria da Soledade. Devido às dificuldades de comunicação (falta de estradas) e ao perigo dos ataques de índios, pouca gente se arriscava a ir morar naquele local e muitos que para lá foram acabaram desistindo das suas terras e mudando-se para lugares menos inóspitos. Tanto que, hoje, muitos destes sobrenomes não são mais encontrados na população de São Vendelino.
Um exemplo disto aconteceu com o colono Felipe Keller. Nascido na Renânia (região situada no vale do rio Reno) em 1820. Ele emigrou para o Rio Grande do Sul no final da década de 1840, depois que terminou a Revolução Farroupilha (de 1835 a 1845) e a imigração alemã ganhou novo impulso. Felipe estabeleceu-se inicialmente no Portão e lá casou com Maria Madalena Nabinger, em 1851. Em 1857, Felipe Keller atuava na Colônia de Santa Maria da Soledade como seu primeiro pastor evangélico. Mas ele e sua esposa não ficaram na colônia por muito tempo. Já em 1861 ele estava em Montenegro (então denominada Porto das Laranjeiras) estabelecido como tecelão de linho. E ele, certamente, fez bem em mudar-se para Montenegro, pois o seu negócio lá prosperou, tornando-se uma fábrica de tecidos conhecida nacionalmente. Felipe chegou, inclusive, a ser condecorado pelo imperador Dom Pedro II com a Ordem da Rosa, no grau de Cavalheiro. A Alemanha, naquela época, já apresentava um elevado desenvolvimento cultural e tecnológico e por isto os imigrantes que de lá vinham traziam consigo conhecimentos que os faziam destacar-se dos demais. Mas a colônia criada por Montravel, devido às dificuldades de comunicação e transporte, não era o local mais adequado para homens capazes, como Felipe Keller, desenvolverem o seu talento de empreendedores.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

344 - A venda da Frangosul segundo Heitor Müller

Heitor Müller, à esquerda, na inauguração da Cúria de Montenegro
Zero Hora publicou, na sua edição de 22 de março de 2009, importante reportagem sobre o Heitor Müller, a Frangosul e a avicultura brasileira.
"Quando os dois representantes do banco holandês Rabobank saíram da sala de reuniões, Heitor Müller sabia que estava diante de uma decisão que poderia mudar a sua vida. Na mesa, com o sócio Flávio Wallauer, ouvira uma proposta para abrir negociação de venda da empresa da qual era sócio-fundador, a Frangosul, para a multinacional Doux.

Aceitar significava, além de receber um bom dinheiro, abrir mão não apenas da companhia que ajudara a criar no final da década de 70, quando Wallauer usava um Fusca para transportar frangos que vendia no Mercado Público de Porto Alegre, mas também do prestígio de dirigir uma das maiores empresas do Estado – com 5,3 mil funcionários e 2,6 mil produtores integrados –, cada vez mais admirada na comunidade após patrocinar uma equipe de vôlei que chegou a vencer o campeonato nacional.

Logo que informado da proposta, Müller fez questão de dividi-la com a esposa, Nilsa. É com ela que até hoje, em casa, tomando mate, ele compartilha suas angústias profissionais. Poder repartir os sentimentos gerados no ambiente empresarial, seja com família ou com colegas, é um privilégio que nem todos têm, mas recomendado por especialistas.

Por isso, é comum, especialmente nos Estados Unidos, mas cada vez mais no Brasil, a formação de grupos de apoio entre empresários inspirados nos YPO (Young Presidents Organization), uma organização norte-americana com presença em mais de cem países que promove encontros para que líderes troquem experiências.

– Quanto mais solitária for a decisão, mais difícil será para o empresário, e mais sujeito a reações psicossomáticas, entre outras, ele estará – afirma o psiquiatra Theobaldo Thomaz.

Do primeiro encontro na Frangosul, em março de 1998, até a batida do martelo, passaram-se sete meses. Tempos de muitas reuniões com sócios e consultores. Mas também de bate-papos informais com diretores ao fim do expediente, às vezes no caminho entre o escritório e o estacionamento. Havia horas, no entanto, em que o melhor era ficar só.

– Você precisa de alguns momentos de reflexão. Nessa época eu me levantava e pensava: “Meu Deus, como é que eu vou enfrentar isso? A Frangosul continua, mas tem essa negociação paralela”. Às 6h, eu vestia um calção e ia nadar, ficar sozinho um pouco para me preparar física e psicologicamente para enfrentar o dia – lembra Müller.

O que também tornava a decisão difícil era o tamanho da empresa. Contando prestadores de serviços terceirizados, o empresário calcula que mais de 20 mil pessoas dependessem da Frangosul.

– O empresário é como um chefe de família, toma a decisão em nome de uma coletividade, essa é função social dele. Ainda que ele pense agir só pelo lucro, existem esses fatores muitas vezes ocultos que só aumentam o drama de consciência, o custo da decisão – analisa Thomaz.

Hoje, 11 anos após a venda da companhia para a Doux e à frente de negócios menores, o empresário diz não se arrepender de ter aceitado a oferta, junto com os demais acionistas, dos quais ainda é sócio. E, mesmo tendo passado por uma escolha deste porte, foi outra aparentemente bem menor que mais lhe deixou em dúvida.

– A decisão mais difícil foi bem antes. Eu tinha meu escritório de contabilidade, com 80 funcionários, o mais respeitado de Montenegro, status, aquela coisa. E era sócio da Frangosul. Uma dia eu tive de optar por um ou outro. E todos os amigos diziam: Heitor tu vais largar teu escritório para criar galinha, tu estás louco. Foi difícil, mas também foi engraçado.

343 - A avicultura brasileira segundo Heitor Müller

Heitor Müller, com o quadro, ao receber o titulo de cidadão de Santo Ângelo
Em matéria publicada por Zero Hora (edição de 22 de março de 2009), Heitor Müller mostra o estágio atingido pelo Brasil como exportador de frangos:
"O Brasil é o maior exportador mundial de frango e o terceiro maior produtor, atrás apenas dos Estados Unidos e China. Segundo o presidente do Congresso Latinoamericano de Avicultura, Heitor Müller, somente esses dados já demonstram a importância do setor avícola brasileiro. Empregando 4 milhões de pessoas em toda a cadeia, a avicultura é case de sucesso e foi tema de discussão durante a 20ª edição do Congresso Latinoamericano de Avicultura, que ocorreu na semana passada, em Porto Alegre (RS).

Global 21 - Qual a representatividade das exportações na cadeia do frango? Quando iniciou o processo de internacionalização?
Heitor Müller - O setor exporta entre 30% e 35% para 150 países, o equivalente a 3 milhões de toneladas, de um total de 10 milhões de toneladas que devem ser produzidas este ano. O processo iniciou na metade da década de 70. No início, as vendas a outros países eram bastante tímidas, mas evoluiu na década seguinte e atingiu o pico na década de 90, quando começamos a comercializar frango em pedaços. Até então só vendíamos frango inteiro.

G21 - Quais os entraves para crescermos em outros países?
Müller - Para o Brasil aumentar as exportações temos que resolver os problemas da Rodada de Doha, formalizando acordos internacionais, com os países desenvolvidos diminuindo os subsídios. No mundo, US$ 1 bilhão ao dia são destinados a subsídios na agricultura. Além disso, alguns países impõem restrições ao frango brasileiro, o que é um disfarce para reserva de mercado. Internamente, temos os mesmos problemas dos outros setores: falta de ferrovias para melhorar e baratear a logística, falta de estrutura nos portos, alta carga de impostos, ou seja, o chamado custo Brasil.

G21 - O setor está agregando valor? Qual a tendência?
Müller - O frango em pedaços é uma agregação de valor e hoje responde por mais da metade das exportações. O conceito que mais cresce no mundo é o "farm to fork" (da cozinha para o garfo), isso significa pratos praticamente prontos. A avicultura brasileira, atenta a essa tendência, produz cortes de frango temperados, congelados individualmente e acondicionados em embalagens mais sofisticadas, em pequenas quantidades, para consumo individual.

G21 - Qual a importância do Plano de Regionalização da Avicultura? Quais as ações em andamento?
Müller - O governo federal está viabilizando o Plano de Regionalização da Avicultura. A questão é a aceitação internacional da regionalização. É preciso que os mercados entendam que o Brasil tem proporções continentais, e que não temos e nem tivemos problemas de doenças, apenas pequenos focos isolados que foram eliminados em questão de horas. Produzimos somente com milho e soja, ou seja, produtos vegetais puros, o que dá uma qualidade inquestionável ao frango. A regionalização pretende justamente que Estados e regiões produtoras sejam considerados independentes para fins sanitários.

G21 - Qual a importância da avicultura brasileira?
Müller - A avicultura brasileira é bastante desenvolvida, é uma verdadeira cadeia produtiva, onde as empresas produzem a própria genética, ração, ou seja, dominam todas as etapas de produção. Temos vantagens como matéria-prima de qualidade na soja e milho, mão-de-obra especializada e terra com 3,3 mil horas de sol ao ano, além de 20% da água doce do mundo. Em toda a cadeia, são 4 milhões de empregos. O Brasil é o maior exportador mundial de frango e o terceiro maior produtor, atrás apenas dos Estados Unidos e China. O consumo brasileiro é de 37 quilos de frango ao ano, de um total de 90 quilos de carne, o que demonstra a importância do nosso segmento."

342 - Jesuitas iniciam a produção de aves

A ordem religiosa dos jesuítas se destaca no mundo inteiro pelo extraordinário valor que dá à educação. E não somente à educação religiosa. Também no campo das ciências, os padres jesuítas se destacaram muito. Considerando o número relativamente pequeno de padres, é impressionante a contribuição que eles já deram ao desenvolvimento científico mundial. Eles se interessaram por todas as áreas de conhecimento, inclusive a ciência da administração. E é notável, também, que embora os padres sejam pessoalmente desapegados dos valores materiais, eles sempre souberam desenvolver atividades empresariais. Um exemplo bem atual deste talento jesuítico é a Universidade do Vale do Sinos, a UNISINOS, que é um dos maiores empreendimentos brasileiros na área educacional, administrado pelos padres com grande competência.
Um outro exemplo deste talento dos jesuítas para os negócios pôde ser observado no colégio dos jesuítas em Salvador do Sul, onde foi implantado o primeiro grande aviário do estado. Começando modestamente, o empreendimento desenvolveu-se de forma extraordinária, transformando-se no maior estabelecimento comercial deste ramo no Rio Grande do Sul. O empreendimento acabou sendo abandonado, depois de sofrer um sério revés, mas deu uma notável contribuição para o desenvolvimento da avicultura no estado e, especialmente, na região. Não é por acaso que o município de Salvador do Sul, embora seja muito pequeno, é hoje o maior produtor de ovos e de perus no Rio Grande do Sul.
O principal personagem desta história é o irmão jesuíta Inácio John. Filho de Aloísio e Alzira John, ele nasceu em 4 de abril de 1934, na pequena localidade de Vale das Flores, no município de Bom Princípio. Aos 15 anos, ele ingressou no seminário jesuítico de Pareci Novo e, desde então, dedicou toda a sua vida a servir à ordem dos jesuítas. Em 1958, o Irmão Inácio foi transferido para Florianópolis, onde ficou por seis anos, trabalhando no Colégio Catarinense. E lá, como sempre gostou de lidar com animais, começou uma pequena criação de galinhas para atender às necessidades de alimentação do próprio colégio. Dentro do espírito jesuítico de dedicação aos estudos, o irmão procurou aprimorar os seus conhecimentos sobre o assunto lendo publicações especializadas no assunto, como a revista Avicultura Brasileira.

341 - Irmão Inácio cria uma grande empresa

Quando, em 1964, foi transferido para o Colégio Santo Inácio, em Salvador do Sul, o irmão Inácio assumiu a administração da cozinha daquele grande estabelecimento. E, como o colégio gastava bastante na compra de ovos e de carne, resolveu criar um aviário. Sua iniciativa contou com o apoio da administração do colégio e desenvoveu-se muito bem. Tão bem que, depois de algum tempo, passou a produzir muito mais do que o necessário para a alimentação dos alunos do colégio. A venda dos ovos tornou-se uma fonte de receita para ajudar a cobrir a manutenção do seminário.
Na época não havia ainda produção de ovos de granja no Rio Grande do Sul e os produtos do aviário criado pelo irmão Inácio John conquistaram o mercado de Porto Alegre, onde eram vendidos pelos grandes supermercados. Antes disto os ovos de granja que haviam para vender em Porto Alegre eram importados de São Paulo. O irmão tornou-se membro da Associação Gaúcha de Avicultura, reunindo-se semanalmente com outros produtores que, naquela época, eram os pioneiros da produção avícola tecnificada no estado. Com seus colegas da Associação Avícola, o irmão fez várias viagens para São Paulo, onde visitou as principais granjas produtoras de ovos, que pertenciam a imigrantes japoneses. E a granja do Colégio Santo Inácio foi a primeira no estado a adquirir uma máquina para selecionar os ovos pelo seu peso. Ela era importada do Japão e selecionava 3.000 ovos por hora. Muitos produtores gaúchos foram visitar a granja para conhecer novidades como esta e aprender as técnicas modernas de produção avícola. E o irmão Aloísio, da mesma forma como aprendeu com os japoneses paulistas, não se negava a transmitir o que sabia para os produtores que o visitavam. O empreendimento cresceu tanto que chegou a contar com 70 mil aves poedeiras e o lucro da atividade era muito grande, representando um recurso importante para o colégio. Por vinte anos a granja do Colégio Santo Inácio existiu, até que veio a sucumbir devido a uma verdadeira catástrofe.

340 - A catástrofe

Todo milho utilizado pela granja para a elaboração da ração dada às galinhas era fornecido por uma grande empresa, uma multinacional de grande renome. Mas, em meados da década de 80, aconteceu um problema gravíssimo. Houve uma grande mortandade de aves na granja e ela acabou sendo interditada pela Secretaria do Meio Ambiente. Estudos feitos pelos técnicos especializados demonstraram que a causa do desastre foi um produto utilizado no tratamento do milho fornecido à granja. O resultado disto foi que a granja foi à falência, acabando com a obra admirável que o irmão Aloísio vinha desenvolvendo há tantos anos.
Este fato representou, na época, um grande sofrimento para o irmão Aloísio. Mas acabou lhe trazendo um benefício, pois ele foi transferido para a cidade de Roma, onde trabalhou por dez anos na administração do Colégio Pio Brasileiro. Neste estabelecimento, onde estudam padres e seminaristas brasileiros, ele viveu o que considera terem sido os melhores anos da sua vida. Lá ele conviveu com as maiores autoridades da Igreja e teve, inclusive, vários contatos com o Papa. Depois desta passagem pela Itália, que lhe proporcionou inclusive a oportunidade de fazer viagens pela Europa, o irmão retornou ao Brasil e trabalhou em estabelecimentos jesuíticos no estado e no Paraná. Hoje, com 70 anos de idade, ele voltou a residir e a trabalhar no Colégio Santo Inácio, em Salvado do Sul.
Ele tem, assim, a oportunidade de voltar a viver no local onde desenvolveu a sua obra mais notável. Salvadorenses como Enor Müller, um dos fundadores da Frangosul, e Elemar Graff, proprietário da Granja Canarinho (uma das maiores produtoras de ovos do estado) colheram com o irmão ensinamentos importantes para o início das suas atividades. E todos reconhecem a importância da atividade do irmão Inácio John para o desenvolvimento da avicultura no Rio Grande do Sul e, principalmente, no município de Salvador do Sul e região. O seu trabalho dedicado e persistente representou o empurrão inicial para a criação de uma das maiores riquezas do Vale do Caí.

339 - Veja aponta o Vale do Caí como região mais desenvolvida do país

A revista Veja é uma das melhores do mundo e tem uma visão muito à frente da mentalidade predominante no país.
Por isto é tão significativo ver, na edição publicada pela revista nesta semana (edição do dia 10 de outubro de 2007) publicou ampla reportagem apontando o Vale do Caí como região mais desenvolvida do país, com níveis de qualidade de vida comparáveis aos dos países mais avançados do planeta.
A reportagem destaca 20 municípios gaúchos que já alcançaram esta situação invejável, diferenciando-se do que acontece no resto do Brasil.
Dos vinte municípios, nove pertencem à região do Vale do Caí: Pareci Novo, Harmonia, São Pedro da Serra, São Vendelino, Bom Princípio, Vale Real, Feliz, Linha Nova e São José do Hortêncio. Outros são municípios vizinhos, também situados na bacia do rio Caí, como Carlos Barbosa, Caxias do Sul, Nova Petrópolis, Picada Café, Presidente Lucena, Morro Reuter, Ivoti, Santa Maria do Herval e Dois Irmãos. O título da reportagem de Veja é “O Vale da Felicidade”. E fica evidente, portanto, que o vale em questão é o Vale do Rio Caí.
Fora da região mesmo, foram destacados apenas Bento Gonçalves e Santa Tereza (novo município que emancipou-se de Bento).

338 - Indicadores positivos

O que levou Veja a classificar estes municípios como sendo de primeiro mundo são os seus invejáveis indicadores de qualidade de vida.
Apenas 4 % da população é pobre (ganha menos de 1/3 de salário mínimo por mês). Índice equivalente ao da Inglaterra.
Apenas 2,8 % é analfabeta. Situação equivalente à do Canadá.
Ocorrem apenas 15 assassinatos ao ano para cada grupo de 100 mil habitantes. Índice igual ao da Finlândia.
A expectativa de vida é de 79,1 anos. Tal como acontece na Bélgica.
25 % dos jovens cursam a universidade. Índice igual ao da Nova Zelândia.
A mortalidade infantil é de sete óbitos por 1.000 que nascem vivas. Tal como acontece nos Estados Unidos.
O desemprego na região é de 5 %. Nível equivalente ao da Suécia.
E o percentual de residências providas de água encanada é de 98 %. Índice tão bom quanto o da Suíça.
A matéria de Veja é digna de ser reproduzida e distribuída para todos os habitantes da região.
Para que o leitor tenha uma idéia, vamos reproduzir alguns cometários da revista sobre os 20 municípios:
“O custo de vida ali ainda é baixo, os serviços públicos funcionam e as pessoas não se sentem inseguras por morar em casas sem muro. Nesse Brasil não tem fila. Em postos públicos de saúde, a consulta começa com o médico acionando seu computador para levantar o histórico do paciente.”
“As crianças enfrentam turnos escolares extensos. Elas chegam a passar oito horas por dia em sala de aula. As notas superam em muito a média nacional e se igualam ao desempenho registrado em países de longa tradição de excelência escolar.”

337 - Quase primeiro mundo

Quem percorre cidades como Bom Princípio, Feliz e São Vendelino percebe que está no Primeiro Mundo ou muito perto disto. As ruas e estradas são asfaltadas, as casas são boas e os jardins caprichados.
Quem conhece estes municípios mais a fundo se impressiona com o empreendedorismo que lá existe, com centenas de pequenas empresas que vêm se desenvolvendo bem. E chama a atenção, igualmente, a quantidade de jovens locais que cursam a universidade.
Fica mais impressionado ainda aquele que conheceu as localidades de Bom Principio e São Vendelino antes da sua emancipação. O progresso que ocorreu ali foi impressionante. Uma verdadeira transformação. E se pode projetar, portanto, que em mais uma ou duas décadas a realidade local seja ainda mais empolgante.
A reportagem da revista Veja serve para nos fazer ver que, de fato, estamos bem próximos de ser primeiro mundo.

336 - Porto Maratá

Grande parte das casas construídas em Porto Alegre no século XIX e nas primeiras décadas do século XX utilizaram madeira de lei extraída das florestas do Vale do Caí. Os troncos das árvores abatidas eram conduzidas rio abaixo, flutuando nas águas do Caí amarrados uns nos outros. Esta atividade foi intensa, também, no Arroio Maratá, pelo qual os irmãos Brochier, que moravam onde hoje se situa a cidade de Brochier. Estes pioneiros, que eram franceses, vieram morar no local pelo ano de 1832 e, como verdadeiros desbravadores, tiveram de enfrentar índios e onças. Até a barra do arroio Maratá o rio Caí oferece condições de navegabilidade o ano todo. Razão pela qual o porto ali localizado serviu como ponto final de navegação antes da construção da barragem Rio Branco. Dali para diante, passageiros e mercadorias que se destinavam ao Caí ou à serra tinham de seguir à pé, em carretas ou carruagem. Só quando o rio estava cheio era possível chegar com barcos maiores até o porto do Caí. Esta situação perdurou até 1906, quando foi concluída a barragem.

335 -Ponte da Mariazinha

A estrada de ferro que ligava Porto Alegre a Montenegro (passando pelas cidades de Capela de Santana, Portão e São Leopoldo) tinha uma ponte sobre o rio Caí. O trem passava por dentro de uma armação de ferro que foi demolida depois da desativação da ferrovia. O ferro foi vendido para ser derretido numa siderúrgica e reaproveitado. A ponte ganhou o nome de Ponte da Mariazinha porque estava situada junto ao Morro da Mariazinha.

334 - Seminário de Pareci Novo

O estado do Rio Grande do Sul tinha uma grande carência de padres, apesar da forte religiosidade do seu povo. Este problema só veio a ser resolvido com a imigração alemã. Foram os padres vindos da Alemanha para atender os imigrantes que aqui viviam que criaram os seminários dos quais brotaram boa parte das maiores vocações sacerdotais surgidas no país até hoje. Note-se que ainda hoje os bispos com nomes de origem alemã predominam nas altas esferas eclesiásticas. O primeiro destes seminários foi criado no Caí, no ano de 1891, dirigido por padres e irmãos jesuítas, todos vindos da Alemanha. Entre eles estava o padre Teodoro Amstad, viajava pelo Vale do Caí em lomnbo de mula dando assistência às comunidades católicas da região. Foi ele que teve a idéia de transferir o seminário, das pequenas instalações que dispunha no Caí, para um grande prédio que pertencera à fazenda de José Teixeira, no Pareci Novo, que estava sendo desativada. O imóvel foi adquirido e, em 1894 aconteceu a transferência. Em poucos anos o seminário cresceu muito, tanto no prédio como no número de alunos, pois eram muitas as vocações sacerdotais que brotavam na colônia alemã do Vale do Caí. Já em 1901 um dos grandes prédios do seminário estava construído. Mas em 1913 o Seminário de Pareci foi transferido para São Leopoldo. E surgiram daí os alicerces da atual UNISINOS. A influência do Seminário de Pareci na UNISINOS foi tão grande que a maioria dos seus reitores estudaram lá estudaram. O Seminário de Pareci Novo continuou funcionando, entretanto, até a década de 60 do século passado, como escola preparatória de meninos que aspiravam ao sacerdócio.

333 - Os casarões da família Oderich

O prédio original da fábrica Oderich foi construído em 1908 e continua sendo utilizado até hoje. Era muito grande para a época, mas depois disto a fábrica situada no centro da cidade foi muito ampliada. Além disto, a Oderich comprou na cidade a fábrica em que funcionou uma filial da Azaléia e outras fábricas em Pelotas, Eldorado do Sul e no estado de Goiás.
O casarão situado na rua Marechal Deodoro, a uma quadra da fábrica, foi construído dez anos antes, em 1898 pelo empresário Adolfo Carlos Henrique Oderich, nascido na Alemanha, de uma importante família da cidade de Wittenburg. Ele estudou técnicas comerciais e, para adquirir experiência, veio trabalhar numa empresa de Porto Alegre, no ano de 1879, quando tinha 22 anos. Como caixeiro viajante, ele conheceu aqui a jovem Henriette Ritter, filha do importante comerciante e industrial de Linha Nova. Adolfo Oderich enriqueceu no Caí com o comércio e a fabricação de banha, que vendia no Brasil e no exterior.
Em 1908 Adolfo Oderich mandou seu filho Carlos Henrique estudar técnicas de conservação de alimentos na Alemanha. E ele retornou no ano seguinte trazendo consigo o conhecimento da mais moderna tecnologia existente na época. Foi fundada, no mesmo ano, a fábrica C H Oderich & Cia, que vem a ser a origem da atual Conservas Oderich SA. A empresa prosperou rapidamente, graças à aceitação dos seus produtos no mercado internacional. O casarão situado na mesma rua Marechal Floriano, a duas quadras da fábrica, foi construído por Carlos Henrique Oderich no ano de 1922.

332 - Prédios da prefeitura

Inicialmente era a Câmara Municipal que exercia o governo do município. E ela, inicialmente, funcionava em prédio alugado. A terceira câmara eleita, que era presidida pelo Coronel Paulino Inácio Teixeira, mandou construiu um prédio próprio para a prefeitura, que passou a ser utilizado em 8 de março de 1886. O prédio original foi construído na esquina das ruas Marechal Floriano Peixoto e Pinheiro Machado.
O segundo prédio, construído ao lado do original, foi erguido pelo ano de 1930, no segundo governo do intendente Alberto Barbosa e serviu inicialmente para abrigar o foro e o quartel da guarda municipal.

331 - Morro da Vigia

O Morro da Vigia se destaca na paisagem do Vale do Caí, proporcionando excelente vista dos vales do Caí, Cadeia e Sinos


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Com a notável altura de 399 metros, o Morro da Vigia se destaca na região e oferece, do seu topo, uma extraordinária vista. Inclusive das cidades que formam a grande Porto Alegre. Fica próximo à cidade de São José do Hortêncio e, especialmente, da pequena e pitoresca localidade de Vigia. Consta que já serviu como ponto de observação militar e que havia uma estrada que, então, possibilitava o acesso até o seu topo.

330 - Cais do porto

O primeiro cais do porto de São Sebastião do Caí foi construído em 1888. Mais tarde, na primeira gestão do intendente (prefeito) Alberto Barbosa (de 1920 a 1924) o cais foi ampliado. A navegação até ao Caí, que era difícil no século XIX devido à baixa profundidade do rio nas épocas de estiagem, melhorou com a conclusão da barragem Rio Branco. Esta obra, construida rio abaixo, perto de Pareci Novo foi iniciada em 1895 e concluída em 1906.
No tempo em que o doutor Caio da Cunha Cavalcanti exercia a função de juiz da comarca do Caí ocorreu um desabamento do cais. O juiz teria, então, enviado um telegrama ao governo, com os seguintes dizeres: “Dr. Borges de Medeiros, Palegre. Caes Cahy Cahiu. Caio.”
Nos seus tempos áureos, vapores de grande calado atracavam no porto, vindos de Porto Alegre. A viagem da Capital ao Caí durava em torno de oito horas, ou mais devido às paradas no caminho para embarque e desembarque de cargas e passageiros. Até 1940 os barcos a vapor faziam diariamente viagens entre o Caí e Porto Alegre e Caí a Montenegro. Alguns anos depois estes barcos, que eram maiores e ofereciam mais acomodações para passageiros, foram substituídos por gasolinas, barcos mais voltados para o transporte de mercadorias.

Alzir Bach, falando com Luiz Carlos Mello, atual Diretor de Operações do DAER, obteve um esclarecimento sobre esse assunto.
O Caio a que se referia a anedota era Caio Brandão de Mello e nunca foi prefeito do Caí. Foi, sim, prefeito de Santa Cruz do Sul. Na verdade, o teleframa nunca existiu. Foi uma piada que fizeram com ele, quando o governador do estado, Cordeiro de Farias, lhe pediu para fazer uma visita ao Caí em nome do Governo.




329 - Ponte de ferro

A ponte sobre o arroio Cadeia conta com estrutura de cimento armado e superestrutura metálica

A ponte de ferro (com piso de cimento armado, mas com superestrutura metálica) sobre o arroio Cadeia foi construída em 1931. Antes a travessia do rio era feita com uma barca; ou a vau, quando o rio estava baixo. Isto se dava no Passo do Cadeia, situado algumas centenas de metros arroio abaixo. A obra vinha sendo reclamada há muito tempo pela população caiense, já que a comunicação por terra para Porto Alegre tinha na travessia do arroio Cadeia um dos seus principais obstáculos (outro era a lomba da Roseta, situada poucos quilômetros adiante).
Desde 1823 a obra havia sido contemplada no orçamento do estado com a verba de 80 mil contos de réis. Mas só sete anos mais tarde, sendo Getúlio Vargas o governador do Estado, a obra foi realizada.
Contava-se antigamente, como fato real, a anedota de que Getúlio (quando era ainda presidente do estado) esteve no local e comentou no armazém de Jacob Klein (situado próximo à ponte, num prédio ainda hoje bem conservado) que brevemente a ponte seria construída. Getúlio não havia se identificado ao chegar no armazém e o comerciante (que era maragato, ou seja, opositor aos governistas chamados de chimangos) desdenhou da profecia. Getúlio, então, se identificou e - irritado com a descrença de Jacob Klein - disse que ele iria ver. E a obra foi realizada rapidamente.
*Getúlio governou o Rio Grande do Sul de 25/01/1928 a 9/10/1930.

domingo, 23 de agosto de 2009

328 - Um milagre econômico no Vale do Caí

Os problemas sociais e econômicos do Brasil têm solução. Podem, provavelmente, ser solucionados de diversas formas. E uma das formas pelas quais os problemas brasileiros poderiam ser resolvidos está exposta neste livro.
Não se trata de uma idéia abstrada. Não se fala aqui de teorias. O que se narra é um caso real; um exemplo prático de como se consegue mudar uma realidade de atraso para transformá-la em progresso espetacular.
O exemplo é de um município. Um pequeno município. Mas se todos os municípios brasileiros seguissem a mesma fórmula, o país se tornaria própero automaticamente. A prosperidade do país seria alcançada pela simples soma dos progressos de cada um dos municípios que o compõem.
O que se conclui deste caso exemplar é que um governo competente é capaz de conduzir o progresso de uma comunidade. A administração pública, que muitas vezes se constitui em entrave ao progresso, pode ser também o meio eficaz de promover o desenvolvimento. O caso aqui narrado é a prova irrefutável disto.
Outra verdade que fica demonstrada é a de que uma grande transformação como a ocorrida em Tupandi não requer o uso de fórmulas complexas e incompreensíveis para pessoas leigas. O método aplicado em Tupandi, e que pode também conduzir o Brasil para o progresso, é bastante simples.
Basicamente, o seguinte:
A administração pública precisa ser austera, contendo gastos supérfluos para que sobre dinheiro para fazer investimentos úteis.
Feito isto, é preciso investir, no desenvolvimento econômico. E este investimento precisa seguir uma estratégia correta, focada nas melhores oportunidades que o município tiver para o o crescimento da sua produção. O município precisa investir em atividades para as quais ele é vocacionado. Além disto, o crescimento da produção deve resultar em forte retorno de impostos, para que a prefeitura possa, assim, repassar à população em geral os benefícios do crescimento econômico.
Seguindo estas três diretrizes, Tupandi conseguiu um desenvolvimento fantástico num prazo surpreendentemente curto. O município que era um dos mais pobres do estado tornou-se o mais rico e isto se refletiu na melhoria de qualidade de vida de toda a sua população. Seguindo o seu exemplo, outros municípios (ou estados, ou países) poderão obter progresso semelhante.
Poderia se dizer que estas idéias são óbvias, que todo mundo sabe disto. O valor do caso aqui narrado, então, está em provar que usando correta e aplicadamente esta fórmula tão simples é possível produzir uma fantástica (e pacífica) revolução, levando um município da miséria à riqueza em apenas uma ou duas décadas.

327 - O milagre

Considera-se que ocorre um milagre econômico num país quando o seu Produto Interno Bruto (o valor de tudo que é produzido no país ao longo de um ano) cresce por um período de vários anos a uma taxa anual bem acima da média normal dos países (hoje em torno de 3 % ao ano). São bastante conhecidos os casos do Milagre Alemão, do Milagre Japonês e do Milagre Brasileiro. Todos estes países passaram por períodos de crescimento acelerado durante um certo número de anos. No Brasil, este fenômeno foi observado no final da década de 60 e início da de 70. Na Alemanha, ele ocorreu principalmente nas décadas de 50 e 60. No Japão, o período de crescimento acelerado foi mais longo e notável. Atualmente, fenômeno semelhante ocorre na China.
Em todos estes casos as taxas de crescimento anual alcançaram, no máximo, um percentual em torno de 10 % ao ano.
Por isto, é tão impressionante o fenômeno que vem ocorrendo no pequeno município de Tupandi.
Situado na região do Vale do Caí, este município conta atualmente com pouco mais de 3.000 habitantes. Emancipado em 1988, ele passou a contar com seu próprio governo a partir do início de 1989. De então até o ano 2000, o seu Produto Interno Bruto cresceu a uma taxa média de 28 % ao ano. Em alguns anos o crescimento esteve acima de 50 %. Com isto, em apenas onze anos a produção do município foi multiplicada por 15. Ou seja. No ano de 2000 a população de Tupandi produziu 15 vezes mais riqueza do que no primeiro ano da sua existência como município independente.
A admirável pesquisa realizada pelo professor Luis Roque Klering (ver site www.terragaucha.com.br), aponta os seguintes números.

Produto Interno Bruto (PIB) de Tupandi:
em 1989 US$ 2.062.245
em 2000 US$ 30.876.080
Crescimento no período: 1.398 %
Crescimento médio anual: 28 %

326 - Hilário Junges

Pelo progresso que conseguiu dar ao seu município, Hilário é sério candidato ao título de melhor prfeito do mundo

Para se entender o que aconteceu em Tupandi é preciso conhecer um homem que foi o protagonista desta história de sucesso. Seu nome é José Hilário Junges. Foi ele que administrou Tupandi em quase todo o período compreendido desde a sua emancipação até a atualidade e é ele, sem dúvida, o grande estrategista e o grande executor do projeto de desenvolvimento que resultou no fenômeno observado neste município. Hilário é um homem simples e despreocupado com a sua aparência. Um trabalhador. Ele não tem diploma de curso superior. Nasceu numa família comum do então pobre vilarejo de Tupandi e aprendeu a trabalhar desde pequeno. Aprendeu, também, a lutar pelos seus objetivos.
Hilário nasceu no dia 16 de dezembro de 1944. Naquela época, Tupandi era um distrito de Montenegro e uma localidade pequena e esquecida. Tivera, anteriormente, um certo destaque como núcleo da colonização alemã na região, como centro de extração de madeira (especialmente o loro, de extraordinária qualidade) e, por ser uma sede paroquial comandada por padres jesuítas. Tupandi (que na época era chamada de São Salvador) teve, no início do século XX um hospital e um colégio comandados por religiosos. Colonizada por descendentes de alemães, a localidade se destacava, naquela época, pela sua forte produção agrícola.
Porém, quando foram construídas as ferrovias e as estradas de rodagem na região, Tupandi ficou fora do traçado das mesmas. A RS-122, rodovia que liga Porto Alegre a Caxias do Sul, passa por São Sebastião do Caí e por Bom Princípio, tendo ajudado no desenvolvimento destas cidades, mas Tupandi ficou à margem deste sopro de desenvolvimento. O mesmo aconteceu com a ferrovia construída para ligar Caxias do Sul a Porto Alegre. Tupandi também ficou fora do seu traçado e Tupandi passou a ser uma pequena localidade esquecida pelo progresso que animava as localidades situadas junto à ferrovia e à rodovia. Na década de 50, quando Hilário Junges era menino, Tupandi havia se tornado um local quase esquecido e, aparentemente, sem nenhuma perspectiva de desenvolvimento.

325 - No seminário

Os pais de Hilário, Pedro Alfonso e Roselina Junges, eram agricultores humildes e a sua infância foi bastante difícil. Quando Hilário tinha dez anos de idade, seu pai faleceu. Ele era o segundo mais novo entre sete irmãos.
A Igreja Católica, àquela época, que era muito forte e influente na região colonial alemã do Rio Grande do Sul, possuía um grande seminário (escola destinada à formação de sacerdotes) em São Salvador, localidade próxima a Tupandi. Foi ali que Hilário, menino órfão, encontrou a oportunidade de estudar. Por ser pobre, ele trabalhava no próprio seminário para custear os seus estudos.
Depois de concluir o curso primário em Salvador do Sul, ele foi admitido no colégio Cristo Rei, em São Leopoldo, para onde foi com o propósito de tornar-se um irmão jesuíta. Os jesuítas tinham, nestes colégios, granjas com hortas e criações de animais para garantir a alimentação dos padres e dos seus alunos. Hilário trabalhava nestas hortas e no aviário do colégio, aprendendo muito com isto. Os padres jesuítas sempre foram voltados para a cultura e a ciência e detinham conhecimentos de técnica agropecuária que eram muito avançados para a época.
Em 1960, com 16 anos, Hilário concluiu os seus estudos no colégio Cristo Rei e, como era um bom aluno, tinha a oportunidade de continuar estudando no Seminário de Pareci Novo. Mas ele optou por deixar a formação religiosa e dedicar-se à agricultura. Aceitou um convite para cuidar de um aviário pertencente a um rico empresário em Sapucaia. O bom conhecimento sobre avicultura que Hilário havia adquirido com os jesuítas, além das suas qualidades pessoais, estavam lhe garantindo um bom salário, apesar da sua pouca idade. Hilário passou, no entanto, por uma experiência traumática ao testemunhar um crime envolvendo o filho do empresário que era o seu patrão.
Chocado, ele decidiu voltar para Tupandi. Hilário havia se tornado amigo de um japonês que trabalhava na granja do Colégio Cristo Rei e aprendeu com ele técnicas evoluídas de cultivo de tomates e outros produtos hortifrutigranjeiros. Este japonês, chamado Ioshiro Nakarana, ensinou técnicas de cultivo ao jovem Hilário e até o encaminhou para colocar a sua produção na cooperativa que a colônia japonesa possuía em Porto Alegre.
Logo na sua primeira safra Hilário colheu 1.000 caixas de tomates, obtendo uma boa lucratividade. De 1961 a 1964, ele se dedicou ao cultivo de tomates e outras hortaliças na propriedade da família, em Tupandi, juntamente com seu irmão Roque.