sábado, 29 de junho de 2013

2219 - Abandonados no meio da floresta

Os colonos, tiveram de superar muitas barreiras até terem
casas confortáveis como essa

Carlos: “Vovô, naquele tempo, quando vocês chegaram aqui, já existia a igreja e o Padre Blees, que sempre me chama de seu Tocaio (1)?”
Vovô: “Aí, Carlos, você acertou de novo! Onde estaria a igreja, onde estaria o Padre Blees? Tudo o que os novos colonos haviam derrubado ainda não tinha o tamanho da nossa roça de agora. Ninguém de nós sabia nada de nada ou como deveria ser lavrada a terra. Derrubamos um eito de mata, se for muito, uma quarta (2), na qual plantamos milho. Picamos todos os galhos e troncos, amontoamos tudo, esperando secar para por fogo. Queimar a mata, como se faz hoje em dia, não era conosco, pois sempre pensávamos que o fogo continuaria floresta adentro e queimaria tudo. Rolávamos os troncos mais grossos para os lados e quando havia um curso d'água, empurrávamos os troncos para dentro dele. 
Depois nos pusemos a desenterrar as raízes, porque nós alemães achávamos que entre tantos tocos e raízes não se podia fazer nada. Na hora de plantar, então, acho que fazíamos tudo mais errado ainda. 
O milho plantávamos apenas um grão em cada cova. Os cereais e o trigo, dos quais plantamos uma boa porção, pela simples razão de que queríamos voltar a comer pão à moda alemã, plantamos muito junto, do mesmo modo como fazíamos na Alemanha, tendo como consequência uma colheita ruim. 
E as nossas construções, então. Não ficaram muito melhores que nossa plantação. Quatro estacas de madeira nos cantos, trançados de cipós e arremates de barro nas paredes, uns buracos nas paredes à moda de janelas, uma cobertura de capim seco e nosso primeiro rancho estava pronto. Pregos não existiam. À moda brasileira, portas e janelas, vigas e caibros eram fixados com “embiras” (3).
Os caixotes trazidas da Alemanha viraram mesa e bancos, e as poucas coisas trazidas de além-mar eram todo o equipamento doméstico disponível. A comida também estava de acordo com esse cenário: milho triturado em moinhos manuais e cozido em água com um purê de abóbra (abóbora). Essa era a nossa comida cotidiana dos primeiros tempos. 
Nós crianças, quando rezávamos o “o pão nosso de cada dia nos dai hoje”, recordávamos com saudades do excelente pão da terra do Mosel, do outro lado do mar, e nosso pai certamente teria trocado os 272 Morgen de floresta pelos 20 ou 25 Morgen da linda terra arável que possuía na velha pátria. Mas agora era tarde para lamentar e nós nos vimos obrigados a transformar a necessidade em virtude, como diz o alemão. Então, minhas crianças, que hoje correm soltas em nossas picadas abertas e que moram numa bela casa confortável, têm o que comer e o que beber à vontade, vocês nem conseguem imaginar como era a vida daqueles pobres abandonados à sua própria sorte em meio à floresta.

1 - tocaio é o mesmo que xará. Ou seja, homônimo
2 - deve ser mais ou menos um hectare (10.000 metros quadrados)
3 - fibra de alguma árvore, usada para amarrar

Texto traduzido do alemão, diponibilizado por Hari Klein
Foto do acervo de Moacir Johann

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