Meu nome é Santos Fagundes. Tenho 52 anos. E como tu sabes sou natural desta terra (1) e tenho um baita orgulho de ter nascido lá no Campestre da Conceição, na antiga casa do seu Tomé Pereira.
Os meus pais, José Francisco Fagundes e Adélia da Silva Fagundes, me deixaram como herança o esteio de toda a minha existência. Os conselhos dos meus velhos até hoje são fundamentais para que eu trace caminhos e semeie horizontes.
Tenho três irmãos, que são mais do que irmãos de sangue, são amigos e parceiros de fé. Falo doMilton da Silva Fagundes, da Vera Heloisa Fagundes e do André da Silva Fagundes.
Sou casado há mais de 30 anos com a Naura. Minha companheira, mulher... Amor, esperança, sonhos, construção de vida. E desta relação nasceram o Eduardo e a Cintia, a continuidade das nossas raízes.
Mas, peço ainda mais a tua atenção.
Até os 9 anos, eu ajudava os meus pais na lida de campo: cuidava dos animais, ajudava no plantio de alimentos, capinava os inços nas roças, colhia frutos...
Também estudava. Passei pelo Grupo Escolar Felipe Camarão e pelo Ginásio São Sebastião. Gostava muito de ler, escrever, conversar com as pessoas e, é claro, jogar futebol com a gurizada.
Até hoje lembro o dia que a direção da escola recebeu um atestado médico informando que eu tinha uma grave doença nos olhos, estava ficando cego. Aquilo me marcou. Eu e meus pais fomos informados que a escola não estava preparada para atender estudantes nessas condições. Foi o meu último dia na sala de aula.
Fiquei por horas e horas, por dias e dias pensando em tudo o que se passara e como eu poderia ajudar os meus velhos, como eu poderia me ajudar. Eu queria ser útil. Eu sentia que alguma força superior me cutucava, me balançava, queria me mostrar o valor da vida, do pão, do ar.
E assim aconteceu. Foi na horta da tia Castorina que os horizontes se alargaram. Colhia verduras e saía pela vizinhança com uma pequena caixa de madeira nos ombros a gritar: olha o tomate, o alface, olha a cebola, a batata... E assim comecei a ganhar os meus primeiros trocados.
Não demorou muito e comprei um balaio de taquara do seu Juvelino Motta e consegui um espaço na feira municipal, em frente ao armazém da dona Petri. Lembro também que tinha um vendedor de amendoim, o seu Pinguinho. Para fazer chamarisco ele apresentava um lagarto que era alimentado com ovos de galinha.
Mas eu queria avançar ainda mais, seguir em frente. À tarde eu ajudava a dona Anita Ranaurer e o seu Aluisio Ranaurer na tradicional Padaria Natal. Minha atividade era a de entregar pão de carroça. Que tempos aqueles!
Com 11 anos de idade ganhei outra oportunidade. Fui trabalhar na oficina de chapeação e pintura Caí-Car. Eu era responsável pela limpeza da oficina e por alguns serviços de rua para seu Astor dos Santos e Edio Klein.
Em 1974, com 14 anos, fui convidado pelo dono da agência da Volkswagen do Caí, seu Martin Muller, e pelo gerente, seu Iguatemi Moreira, a fazer parte daquela empresa. Confesso que pulava de felicidade.
Até 1979 trabalhei como auxiliar de chapeação e pintura. Aprendi a conhecer as diferenças das tintas pelo cheiro: existia a laca nitro-celulose, esmalte sintético, base poliéster e seus vernizes e solventes.
Que grande experiência foi aquele momento da minha vida. Foi aí que eu comecei a desenvolver o tato, conhecendo as espessuras das lixas e modelos de ferramentas. Participava da vida social da empresa e ainda jogava futebol.
Eu tinha 19 anos. Ainda me restava um pouco de visão, mas eu não podia me dar o direito de desistir, de abdicar dos meus sonhos, de me exilar, de renunciar a tudo que até aquele momento havia vivido. E eu nem fazia ideia do que ainda teria que enfrentar...
Relato de Santos Fagundes sobre a sua infância e juventude no Caí
1 - Santos é natural de São Sebastião do Caí
2 - Não podendo estudar, Santos ficou analfabeto até os 26 anos, quando abrendeu o alfabeto Braile. Tornou-se chefe de gabinete do senador Paulo Paim e foi presidente do PT em São Sebastião do Caí e candidato a prefeito.
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