Construção nos fundos do armazém da família Ritter onde teria sido fabricada a primeira cerveja do estado. |
A imigração alemã no Brasil teve início no ano de 1824, com a chegada dos
primeiros imigrantes germânicos à então Real Feitoria do Linho Cânhamo, hoje
cidade de São Leopoldo. A imigração foi incentivada pelo governo imperial, cujas
lideranças encarregaram engenheiros para a medição dos primeiros lotes de terra,
que seriam doados aos estrangeiros. As primeiras localidades ocupadas pelas
famílias provenientes da Alemanha, além de São Leopoldo, foram Novo Hamburgo,
Campo Bom, Estância Velha, Ivoti e Dois Irmãos. As terras férteis e a
proximidade destas com o Rio dos Sinos, aliadas à qualidade de mão de obra e à
diversidade de qualificações profissionais dos pioneiros, facilitaram o
desenvolvimento desta região.
À medida que as terras eram ocupadas, o Império também demarcou lotes no
Vale do Caí. Nessa área, a primeira localidade povoada ficou conhecida como
Picada do Rio Cadeia ou Picada dos Portugueses, posteriormente recebendo o nome
de São José do Hortêncio, ocupada a partir do ano de 1828. A maioria dos
imigrantes era proveniente do Hunsrück, região ao sudoeste da Alemanha. Em 1835,
com a Revolução Farroupilha, a emigração para o RS foi interrompida por 10 anos.
Um ano após o término da revolução, em 1846, o processo imigratório foi retomado
e novas colônias foram abertas, entre elas a Picada Nova ou Linha Nova, como
mais tarde foi chamada, no ano de 1847. Os primeiros habitantes de Linha Nova
vieram da Alemanha, principalmente de cidades de Hessen e do Palatinado, e
também das colônias mais antigas, sobretudo de São José do Hortêncio. Linha Nova
era uma picada no sentido Norte-Sul, incrustada entre vales e serras, coberta de
espessas matas, fazendo divisa ao Norte com Nova Petrópolis, ao Sul com São José
do Hortêncio, a Leste com Picada Café e a Oeste com Picada Feliz, hoje município
de Feliz. A picada original transformou-se na principal rua da cidade, hoje
denominada Rua Henrique Spier. Entre os fundadores estava o imigrante Georg
Heinrich Ritter, que se estabeleceu ali em 1847, juntamente com sua esposa.
Georg destacou-se no Vale do Caí e mantinha em Linha Nova uma conhecida casa
comercial.
Ainda na Europa, Ritter aprendeu com familiares maternos o ofício de
cervejeiro. Ele foi o primeiro imigrante de que se tem notícia a fabricar
cerveja, não somente para consumo próprio, mas também para a venda deste
produto.
A cerveja dos Ritter fez muito sucesso na localidade e na região. A bebida
era fabricada numa pequena construção nos fundos de casa e Ritter a vendia na
loja que mantinha, nas festas e em bailes da colônia. Segundo relatos, suas
primeiras cervejas foram feitas logo após sua chegada, em 1847. Registros mais
confiáveis, porém, remetem ao ano de 1864. Mais tarde, em 1883, Georg retornou à
Alemanha por alguns anos. Após regressar ao Estado, morreu em Linha Nova, em
1889. Seus descendentes também se dedicaram à fabricação de cerveja, como seu
filho Heinrich, que em 1880 mudou-se para São Sebastião do Caí, onde se tornou
sócio de seu cunhado, Cristiano Jacó Trein. Em 1888, mudou-se para Porto Alegre
para auxiliar sua prima na administração da Cervejaria Becker, sob liderança do
empresário hamburguense Frederico Mentz. A partir de 1894, Henrique (Heinrich)
Ritter passou a administrar sua própria cervejaria no bairro Moinhos de Vento,
em Porto Alegre. Em 1906, Henrique e os filhos transferiram a fábrica para a Rua
Voluntários da Pátria e a razão social passou a ser H. Ritter & Filhos. Mais
tarde, em 1924, a Cervejaria Ritter uniu-se com outras duas empresas familiares
com a razão social Bopp, Sassen, Ritter & Cia. Ltda. e o nome comercial de
Cervejaria Continental. As três cervejarias uniram-se para enfrentar as mudanças
no mercado, que começava a ser dominado por grandes empresas. A Continental
instalou-se no prédio da Cervejaria Sassen, na Avenida Cristóvão Colombo, 625.
No ano de 1946, a Cervejaria Continental foi adquirida pela carioca Companhia
Cervejaria Brahma, tornando-se a maior potência cervejeira do país.
A história dos pioneiros ainda está presente em Linha Nova, seja na
preservada casa comercial de 1864, no prédio onde era fabricada a cerveja – que,
após criteriosa restauração, será reinaugurado às 14h do próximo domingo, como
Centro Cultural –, nas antigas garrafas de cerâmica ou ainda nas conversas,
contos e lembranças das pessoas. Este legado necessita ser resgatado, pois é
motivo de orgulho para a comunidade linha-novense e também para todos os
gaúchos.
Texto e fotos divulgados na coluna Almanaque Gaúcho, de Ricardo Chaves.
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