domingo, 23 de junho de 2013

2186 - Construção da igreja de Picada Cará

O povo humilde da comunidade de Picada Cará, no interior de Feliz,
foi capaz de construir uma grande sociedade e uma belíssima igreja

As terras que margeiam o rio Caí no atual município de Feliz começaram a ser adquiridas por imigrantes  alemães logo depois da Guerra dos Farrapos. As que se encontram na margem direita do rio, situadas entre o rio Caí e o arroio Forromeco, que pertenciam ao governo, foram medidas e distribuídas aos imigrantes a partir de 1846, ano de fundação da Colônia de Feliz, sob a administração do diretor da colonização, doutor Hillebrand.
Toda a extensão de terras situada à margem esquerda do rio Caí já era ocupada por proprietários particulares que possuíam diversas fazendas. A fazenda de Escadinhas pertencia aos Moraes; as terras que formam as localidades de Coqueiral, Roseiral, Picada Cará, São Roque, Bananal, Nova Caxias e outras, incluindo todas as terras desde Escadinhas até Linha Temerária, localizada no município de Nova Petrópolis, formavam a Fazenda Cará, que pertencia a Tristão Monteiro.
Eram grandes extensões de terra cobertas por florestas, continuidade da floresta tropical atlântica, que adentrava no continente pelo vale do rio Caí e era explorada, na época, para a extração de carvão vegetal.
Não se sabe ao certo quando ocorreu a ocupação dessas terras. O proprietário Tristão Monteiro, vendeu lotes a preços e juros baixos para os primeiros adquirentes, que foram Jacob Weissheimer e Peter München.
Em 1862, foi organizada a vida comunitária de Picada Cará e, pelos registros daquele ano, foram adquiridos arame de cerca, velas, vinho e outros produtos, o que faz supor que esses bens tenham sido utilizados para a celebração de missas e bençãos.
A primeira coleta que o livro caixa daquela época apresenta data de 29 de outubro dee 1863. No mesmo ano, houve mais três coletas em novembro e seis em dezembro.
A primeira capela era de madeira e localizava-se onde se encontra o cemitério e o padroeiro da comunidade já era São Miguel. Fato que se constata porque, no dia desse santo, a coleta era superior à dos demais. Isso indica que, naquele dia, por ser o do kerb, aumentava o número de participantes na missa, porque os parentes dos moradores vinham visitá-los.
Em determinado ano, justamente no dia do kerbs, o rio havia subido muito e a enchente inundou a baixada que dá acesso ao cemitério, impossibilitando a celebração da missa do padroeiro. Esse fato fez com que a comunidade cogitasse de construir a igreja em outro local. Não mais ao lado do cemitério, como era o costume.
Em 1964 a vida comunitária já era melhor organizada e os sócios já eram 22: Peter Klein, Johannes Klein Mathias Bohn, Nicolau Klein, Mathias Froelig, Arnold Kuhn, Jacob Stroeher, Heinrich Müller, Johan Weber, Gabriel Kaufmann, Johan Krewer, Wilhelm Schmedecker, Peter Birk, Johan Henz, Peter München, Philip Kerber, Jacob Martini e Peter Martini.
Além desses, que formavam a comunidade católica no livro caixa em 1864, aparece o nome de Jacob Weissheimer, que era evangélico e, segundo o livro Hundert Jahre Doutschtum in Rio Grande do Sul, foi o primeiro morador imigrante da Picada Cará.
A partir de 1863, foi realizado um trabalho completo de contabilidade, indicando todas as receitas e despesas da comunidade. No ano anterior, ou seja, e, 1862, apenas constam algumas despesas, não sendo contabilizadas as receitas.
O mesmo livro caixa, a partir de 1864, faz referências a padres, sem indicar nomes. Nesse mesmo ano deve ter sido iniciada a construção da primeira capela, junto ao cemitério, àqual referimos acima. Embora que não haja comprovação dessa afirmação. Conclui-se que tenha sido naquele ano pela compra de material de construção registrada na contabilidade.
Em 1878, pela primeira vez, os padres que atendiam a comunidade são indicados pelos seus nomes. Estão registrados os padres Bernard Ehring, Carlos Blees e Michel Kellner. E o número de associados havia aumentado para 35.
Em fevereiro de 1881, morreu Johann Froelig, reduzindo o número de associados para 34.
Somente a partir de 1879 a contabilidade era assinada pelo tesoureiro, Friedrich Glaeser.
Em todos os domingos e feriados eles se reuniam. Quando não havia missa, havia benção. Mas sempre era feita a coleta. 
A comunidade católica de Picada Cará pertencia à paróquia de São Sebastião do Caí e o único caminho que existia para a comunicação com a sede era o de Roseiral - Morro Grande - São José do Hortêncio - São Sebastião do Caí. (1)
No ano de 1882, outros nomes aumentaram o número de moradores da localidade, como os de Nicolau Ludwig, Nicolau Bohnenberger, Jacob Dewes, Wilhelm Stein, Philipp Scheidt, Michel Lorscheiter, Peter Heck, Anton Geier e Theodor Werner.
Em fevereiro de 1883, começaram as coletas para a construção da nova capela, contribuindo cada associado de acordo com as suas possibilidades. Naquele mesmo ano foi lançada a pedra fundamental da primeira parte da atual igreja, aumentando substancialmente as contribuições dos associados. Entre 28 de outubro ee 1883 e 22 de março de 1884, essas alcançaram a vultosa soma de 2.618.820 réis.
A comunidade cresceu com a participação de novos associados: Johan Ludwig, Michel Weber, Nicolau Feltes, Mathias Feltes, Johann Feltes, Johann Griebler, Viúva Griebler, Nicolas  Backes, Heinrich Dresch, Nicolaus Reichert e Peter Binsfeld.
Em fins de 1887, a construção do prédio da igreja estava concluída. Em 1888 foi iniciado o trabalho de confecção do altar-mor e altares laterais. Foram também adquiridos o banco de comunhão, o confessionário e cadeiras. O coro, como também as outras obras de marcenaria, são verdadeiras obras de arte e foram confecionadas por Michael Flach. As estátuas do altar-mor e altares laterais foram adquiridos em 1889.
Nada consta sobre o campanário e o sino. Porém, está registrado em caixa que, em 1890, Johan Krewer recebeu 15.000 réis para bater o sino. A aquisição dos quadros da via-sacra ocorreu em 1896, concluindo-se, assim, a parte mais antiga da capela.
Em 1826, foram iniciadas as coletas para a ampliação da igreja: a parte frontal e a torre. A pedra fundamental dessa nova etapa foi lançada em 1º de outubro de 1928. Naquele ano estavam inscritos 100 associados que, em conjunto, doaram 28.670.000 (vinte e oito contos e seiscentos e setenta mil réis), num só ano, para a ampliação da capela.
Deve se lembrar que, na época, os moradores da vizinha localidade de São Roque faziam parte da comunidade de Picada Cará. Mais tarde eles se desmembraram e construíram uma igreja admirável.
A contabilidade dos anos 1927 e 1928 registraram toda a receita e despesa, inclusive os empréstimos realizados para a ampliação da igreja, não apresentando mais despesas com material de construção e mão de obra após 1929. O que leva a crer que a capela estava totalmente concluída ao findar o ano de 1928.
Evidencia-se, em torno dessa obra de nossos antepassados, um alto espírito comunitário e profunda fé cristã. Em número reduzido, com muito esforço e dedicação,  edificaram a imponente obra de arte que é a igreja de Picada Cará.

Texto do professor Pedro Alfredo Christ baseado no Livro Caixa da Comunidade de Picada Cará e no Hundert Jahre Deutschtum 
in Rio Grande do Sul.


NOTA DO BLOG HISTÓRIAS DO VALE DO CAÍ 
1 Essa afirmação parece estranha porque, pela nossa visão atual,  São Sebastião do Caí é um núcleo urbano mais importante do que São José do Hortêncio. Mas não era assim no passado. Até a década de 1870, Hortêncio era muito mais populosa e mais importante economicamente do que o Caí. As poucas estradas que existiam na região, na época, passavam por Hortêncio, Linha Nova e Feliz. O Caí só foi escolhido para ser sede municipal, em 1875, por causa do seu porto e a escolha, na época, causou espanto e indignação.

2 comentários:

  1. Meu mano Pedro que escreveu esta história da nossa terra natal, fez um trabalho completo e esclarecedor da Picada Cará. Meus parabéns que todos conheçam algo dessa terra boa e generosa.

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  2. Uma história interassante dos séculos 19 e 20,O que não entendo porque os alemães migraram para o Brasil no século 19 se, a primeira guerra mundial aconteceu no início do século 19.
    Nos relatos constam os nomes dos imigrantes doadores nas construções dos templos,como prosperaram aquelas comunidades.
    Os livros caixa das igrejas constam os nomes dos ofertantes,já havia na região homens e famílias monetariamente ricos,em relação há outros em tempos difíceis. Me chama atenção que os templos construídos exibiam em seus altares deuses pagão, não entendo porque padres não pregam muitas partes da Bíblia católica Apostólica Romana,livro da Sabedoria capítulos 12,13 e 14,Salmos 115 Êxodo 20 Ezequiel cap.14,no Apocalipse cap 22 disse que os idólatras ficarão de fora, e no entanto vejo que os templos pagãos dos idólatras são monumentais e imponentes ostentando riquezas, e seguidores pobres em muitas regiões do mundo.Será que as imagens de barro e gesso etc, feitas por mãos humanas tem poder ? Então Martin Lutero estava equivocado...e eu também ?

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