Conexão Las Vegas: A Incrível História de Charles Nizet

Ainda que não se possa acusá-lo de competente, seus filmes – todos inéditos nos cinemas brasileiros e com equipe e elenco praticamente desconhecidos – são muito divertidos.


A história de Nizet fica ainda mais interessante a partir da década de 1990, após dirigir seu sétimo e último longa-metragem, “Rescue Force” (1990) – que conta com o veterano Richard Harrison no elenco, além dos militares Don S. Davis e James ‘Bo’ Gritz, famoso nos anos 1980 por tentar resgatar prisioneiros de guerra norte-americanos no Vietnam. Apesar de a trama se passar no Oriente Médio, o filme foi inteiramente rodado no deserto de Nevada (EUA), no quintal de Nizet.

Nunca mais se ouviu falar do assunto.
Supostamente, essa era a segunda investida do belga em terras brasileiras. Segundo reportagem do jornal ‘Pioneiro’, de Caxias do Sul (RS), Nizet contava aos amigos que, na década de 1950, comprara uma mina de ouro em Minas Gerais, mas foi ameaçado de morte pelos próprios sócios e obrigado a retornar a Las Vegas. Décadas depois, casou-se com uma brasileira, que conhecera no aeroporto de Guarulhos. Viveram em Las Vegas por dois anos, de 1998 a 2000, quando decide retornar ao Brasil.
É então que o nome do belga ressurge nos jornais brasileiros em grande estilo.
Nizet e seu sócio, David Morgan, adquirem uma imensa área de 94 hectares às margens da rodovia RS-122, no pequeno município gaúcho de São Sebastião do Caí (RS), de apenas 22 mil habitantes.
Preço: R$600 mil reais, pagos à vista.
Objetivo: construção do gigantesco Las Vegas Park, um parque temático que contaria com a maior montanha-russa do mundo, com 3,5 quilômetros de extensão e 175 metros de altura, construída ao redor de um hotel de 40 andares, no formato de uma garrafa de Coca-Cola (Ver primeira foto).

O espaço ainda contaria com área para grandes shows e cinco hectares destinados à construção de estúdios cinematográficos.
Orçamento: R$ 535 milhões de reais.
Nizet apresentou o projeto para empresários locais e donos de outros parques brasileiros. A meta era fazer os interessados comprarem cotas do empreendimento, formando uma associação.
Fixou residência no município de Flores da Cunha (RS). Virou celebridade instantânea.
Alugou um ginásio de esportes local, onde, segundo o jornalista Róger Ruffato, do jornal ‘Pioneiro’, “descarregou os contêineres que traziam filmes e câmeras velhos, material de cenografia, livros antigos, copos, pratos, transformadores e até batedeira [...] Tudo foi acondicionado no espaço trancado por cadeados e vigiado por câmeras que nunca funcionaram, apenas serviam para manter criminosos afastados. A mesma tática era empregada na casa onde Nizet vivia com a esposa e as enteadas”.
Apresentava-se na cidade como ex-agente da CIA. Levou um dos amigos que fez em Caxias do Sul (RS) para uma estada em Las Vegas, onde, segundo o hóspede, Nizet era dono de uma mansão, um Cadillac novo, camionetes, motos e um avião Cessna.
Seu colega de profissão, o falecido diretor Ray Dennis Steckler – outro morador do estado de Nevada – quando perguntado sobre o belga, o descreveu como “um sujeito misterioso, sempre muito bem vestido, com ternos e sapatos caros e acompanhado de belas mulheres”. “Não é bom que você me conheça”, teria dito Nizet a Steckler.
Na noite de 4 de fevereiro de 2003, Nizet recebeu um telefonema e saiu de casa. Ao voltar, percebeu que fora seguido por um carro até a porta de sua residência. Desceu de sua ‘Blazer’ armado, mas não teve como reagir ao primeiro disparo em sua direção. Seguiram-se mais dois tiros de pistola, o terceiro no rosto.
Nizet morreu na hora. Tinha 70 anos.
Dois suspeitos do crime foram presos. Meses antes do assassinato, um deles havia sido denunciado por Nizet por ameaça, supostamente após a assinatura da escritura da área do Las Vegas Park. A dupla foi inocentada em 2005, por falta de provas, e o inquérito foi arquivado.
O corpo de Nizet segue, até hoje, na capela da família de um amigo de Caxias do Sul (RS), Eliseu Marin, numa gaveta sem foto, nome ou qualquer indício de que seus restos encontram-se ali. Seu sócio voou dos EUA para acompanhar o enterro – as ex-esposas e filhos do cineasta não vieram – e levou os objetos estocados no ginásio. Não deu entrevistas.
Um investidor visionário? Um apaixonado por cinema? Um picareta? Nizet levou as respostas para o túmulo. Deixou um legado de filmes vagabundos e divertidos, além de um punhado de histórias mais estranhas que sua própria imaginação poderia criar.
escrito por Fábio Vellozo.




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