segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

5132 - O Kerb, por Eduardo Kauer

O kerb em tela de Pedro Weingärtner


Quando se iniciou o processo de cristianização da Europa, durante a Idade Média, cidades e vilas começaram a construir seus templos. Igrejas e catedrais foram erguidas no centro das praças e dos mercados, em local de destaque. Tudo isso representava o prestígio que a Igreja conquistara. 
A vida, muito curta e brutal naquele tempo, não deixava muitas alternativas ao povo. Participar da construção de um templo religioso transformava-se numa das poucas maneiras de perpetuar a existência do indivíduo. Também havia sérias rivalidades entre regiões, cidades e famílias que despertavam o sentimento de competição: Quem construiria o templo mais belo, mais alto e mais resistente¿
A construção das catedrais se estendia por séculos. Gerações se sucediam na certeza de que não veriam o final de seu trabalho. Os resultados teriam proveito apenas para os seus sucessores. Assim se criou a superstição de que a Igreja estava sempre se reformando. 
Quando uma construção dessas ficava pronta, isso representava o coroamento de um trabalho hercúleo. Pode-se imaginar o contentamento que enchia os corações. 
Nas regiões do Pfalz (Palatinado) e do Hunsrück, que hoje compreendem o estado alemão da Renania-Palatinado, essa comemoração passou a ser chamada de Kircheweihfest. Ou traduzindo para o português: festa de inauguração de um templo. Essa palavra mais tarde foi contraída, transformando-se no termo: Kerb. 
Em outros locais passou a ser o Kirch Messe: a missa do templo ou festa da construção do templo, de onde provém a palavra Quermesse. Na Alemanha também é usada a palavra “Kerwe” com o mesmo significado. E até no Jornal O Progresso encontramos a palavra “Kerbe” com esse uso. 
Seja usado o termo kerb ou quermesse, eles têm o mesmo significado: a festa da inauguração de um templo religioso. É o dia em que a obra de construção de um templo religioso foi terminada. Não deve ser confundido com a festa de um padroeiro ou de outro feriado religioso. 
No Brasil, embora não se tenha produzido obras tão gigantescas e belas, a vitória sobre as dificuldades na construção também ganhara o status de verdadeira celebração. Dos morros retiravam pedras, das florestas vinham as toras e dos barrancos dos rios a argila para as telhas; representando esses materiais todo o espectro de lutas sobre os elementos da natureza. 
Para inaugurar suas igrejinhas no Novo Mundo, convidavam seus amigos e conhecidos das picadas vizinhas. A festa iniciava no domingo pela manhã com missa ou culto. Na porta do templo, a banda esperava com suas músicas para conduzir todo povo ao salão de baile. Comida e bebida deveriam ser fartas para demonstrar sua satisfação com o evento.
Por três dias, as mulheres cozinhavam e assavam sem dó da criação: porcos, vacas, patos, galinhas e marrecos sacrificados diante do júbilo de saciar a gula. Alimentavam muito mais o júbilo do que os corpos. Nas casas todos tinham hóspedes e ninguém ficava sozinho: o padrinho vinha ver o afilhado, os namorados marcavam encontros e os amigos bebiam juntos. 
Segunda à noite continuava o baile. Podia ser completado com apresentações artísticas, teatro ou coral. A tristeza só começava a mostrar sua face mais amarela quando terminava a terça à noite. O terceiro dia de festas, reservado para os casais, completava a programação. Porém, encerrava o ciclo religioso e social que só se repetiria no ano seguinte.


Texto de Eduardo Kauer, divulgado no seu Facebook

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