terça-feira, 18 de agosto de 2015

1576 - Um milagre chamado Tupandi

Plano estratégico de desenvolvimento resultou em extraordinário
progresso do município de Tupandi


Texto produzido pelo economista Daniel Fink, em 2009, para 
apresentação de tese na universidade em que formou-se, na Coréia do Sul

Num pequeno município brasileiro, uma honesta, dedicada e competente administração conseguiu multiplicar o PIB per capita por trinta em apenas vinte anos. De 700 para 20.000 dólares. O objetivo desse relato é possibilitar que ele sirva de modelo para o desenvolvimento das cidades vizinhas, no Vale do Caí.

Introdução
A adoção do método científico proporcionou um extraordinário desenvolvimento para a humanidade. Através dele, novas descobertas podem ser copiadas e aplicadas para benefício da humanidade. Porém, as descobertas precisam ser bem analisadas, documentadas e compartilhadas.
Sobre esse assunto, temos o prazer de apresentar o case de um município brasileiro localizado no Vale do Caí, perto da cidade de Porto Alegre, ( capital do estado do Rio Grande do Sul), no sul do Brasil. O município é Tupandi, onde um trabalho administrativo competente conduziu uma comunidade da pobreza para uma situação de riqueza e prosperidade em apenas duas décadas.
Tupandi emancipou-se em 1988, através de um referendo local. Nos seus primeiros onze anos de existência, o seu PIB per capita multiplicou-se por onze, passando de US$776,16 para US$10.438,16  Nesse período,  o  crescimento médio anual foi de 28%. Nos seis anos seguintes, de 2001 a 2006, o crescimento não foi tão intenso. Mesmo assim, em 2006, o PIB per capita chegou a US$22.239,26, equivalente ao da Coréia do Sul.
É importante considerar que nenhum fator exógeno contribuiu significativamente para o crescimento observado. O diferencial de Tupandi é baseado na qualidade da sua administração municipal. Também, existem fortes evidências de que o ex-prefeito Hilário Junges desempenhou um papel fundamental nesta realização.
O livro intitulado Um Milagre Chamado Tupandi (publicado em 2004) analisa as táticas, políticas, e procedimentos empregadas por Hilário Junges durante a sua administração. Com isso, é possível estabelecer, com bastante precisão, os procedimentos administrativos que permitiram o êxito extraordinário de Tuapandi. Procedimentos estes que podem ser utilizados em outros municípios. Municípios vizinhos estão tentando aplicar esse método, com resultados semelhantes.
O método é simples e nada impede a sua implementação em qualquer município com resultados similares. Este pode ser, portanto, um meio prático e aplicável meio de promover o desenvolvimento econômico em comunidades pelo mundo a fora.
Basicamente, o método administrativo que possibilitou tão grande sucesso em Tupandi é extremamente simples.

O método
Tudo começa com a premissa básica de que o prefeito e seus principais assessores devem agir com honestidade e espírito público. Na verdade, o método administrativo que proporcionou grande progresso em Tupandi é bastante simples:
1. Aumentar a capacidade de investimento através da contenção de gastos
A administração de Tupandi implementou um rígido controle de despesas da prefeitura, evitando gastos desnecessários e o empreguismo. Os funcionários devem ser escolhidos pela sua eficiência e não por razões políticas ou preferências pessoais.
Como as administrações públicas são, geralmente, ineficientes, a adoção de uma administração austera e eficiente resulta em maior poupança e significativo incremento na capacidade de investimento da prefeitura.
2. Buscar recursos fora do município
Além de conter seus gastos, a administração pode buscar recursos fora dos seus cofres, especialmente em programas de desenvolvimento promovidos pelos governos federal e estadual. É fundamental o comprometimento dos administradores na formulação dos projetos que serão apresentados às instituições provedoras dos financiamentos. Investimentos do setor privado devem ser incentivados, mesmo quando a empresa é de outro município.
3. Preferência pelo estímulo à produção
Recursos obtidos com cortes de despesas e de fontes externas deve ser investidos, inicialmente, no incremento da capacidade de produção no município. Razões: 1) aumento da renda da população; 2) aumento na arrecadação  de impostos. Em conseqüência disso, a prefeitura obterá aumento na sua capacidade de investimento.
4. Adoção de um plano estratégico
Desenvolver um plano estratégico é muito importante. Este plano não precisa ser sofisticado. No caso de Tupandi, ele foi muito simples. Aproveitando a vocação rural da população local e fazendo uso dos recursos que a prefeitura acumulou com a contenção de gastos, a administração proporcionou forte estímulo aos produtores rurais , ajudando-os a construir aviários e pocilgas.
Nesta atividade, os produtores rurais trabalham em integração com grandes empresas que compram a sua produção. Essas empresas (chamadas integradoras) lhes fornecem tecnologia avançada e insumos: ração, pintos e leitões com alta teconologia e produtividade. Os pagamentos são feitos com emissão de nota fiscal, o que proporciona arrecadação de impostos, ao contrário do que acontecia antes, quando a agricultura era de subsistência.

Um salto no desenvolvimento
O município era extremamente pobre. Não tinha indústrias, o comércio era precário, a estrutura de comunicações (rodovias, telefone) era desastrosa. A agricultura era rudimentar, servindo apenas à subsistência das famílias. Os jovens não tinham perspectiva no seu município e migravam para cidades maiores. busbuscando emprego em fábricas com baixos salários. Inicialmente, o prefeito Hilário Junges tentou fomentar o desenvolvimento do seu município através da atração de indústrias, aproveitando a disponibilidade de mão de obra. Mas, a dificuldade de acesso por rodovia, falta de telefonia e o precário abastecimento de energia representavam enormes barreiras para a atração de indústrias.
No Brasil, a atração de indústrias é a estratégia convencional usada por administrações municipais para promover o desenvolvimento.
Percebendo a limitação do modelo focado na indústria e a dificuldade de aplicá-lo num município como Tupandi, a administração desenvolveu um novo plano que provou ser extremamente efetivo e que resultou num salto de desenvolvimento.
Este plano foi adotado em 1993, o quinto ano após a criação do município, e era baseado num forte incentivo  à implantação de aviários e pocilgas. A administração aproveitou a oportunidade de uma parceria com a maior exportadora de carnes do estado (Frangosul). Em dois anos (1993 e 1994) foram implantados 198 modernos aviários e pocilgas no município.
Esse plano foi inédito na região, pois foi o primeiro em que a administração investiu diretamente nos produtores locais. Ao produtor rural (integrado) que se dispunha a construir um aviário eram concedidos benefícios como acesso, terraplenagem, telhado e cortinas para o galpão. O município e a empresa integradora  providenciavam, ainda, a assistência técnica e apoio para a obtenção do financiamento.
Por outro lado, o plano estratégico consumia a maior parte da capacidade de investimento da administração, o que restringia o atendimento a outras necessidades imediatas da população. Por exemplo: o uso intenso do maquinário da prefeitura prejudicou a conservação das estradas por um longo tempo.

Results
Os resultados desse esforço foram notáveis: o crescimento do PIB municipal foi de 95% em 1995 e manteve-se alto nos anos seguintes. Porém, os benefícios para a população não foram sentidos imediatamente e o governo municipal perdeu popularidade. Em conseqüência disso, nas eleições de 1996, Hilário Junges não conseguiu eleger o seu sucessor. Alguns anos depois, porém, o sucesso do plano estratégico de desenvolvimento tornou-se evidente. Hoje em dia, Tupandi oferece condições de vida de primeiro mundo para a sua população. A maioria das estradas são pavimentadas, inclusive as de pouco tráfego. Os jovens são beneficiados com apoio financeiro para cursar a universidade.  A saúde pública municipal é um exemplo para a região e o poder aquisitivo das famílias é muito maior que nos outros municípios.
Hilário Junges não é um gênio em administração ou economia. O plano idealizado e realizado por ele foi relativamente simples. O notável resultado obtido deveu-se à sua honestidade, entusiasmo pela causa pública e persistência. Sem dúvida, a sua capacidade ao formular um plano de desenvolvimento estratégico viável e ambicioso foi fundamental para alcançar esse resultado tão positivo.
O sucesso de Tupandi motivou diversos municipios do Vale do Caí a seguir o mesmo modelo. O resultado disso foi um forte desenvolvimento da industrialização de carnes e ovos focada na exportação. Atualmente, existem mais de mil modernos aviários e pocilgas na região (cuja população é de 160.000 habitantes). A base industrial conta com fortes empresas, como a Doux, Oderich, Agrosul, Naturovos, cooperativa Ouro do Sul e Agrogen. Tudo isso evidencia a criação de um cluster agroindustrial de produção de alimentos para a exportação.

O próximo desafio
Atualmente, Tupandi e outros municípios do Vale do Caí precisam de um plano para um novo salto no seu desenvolvimento. Uma alternativa viável pode ser uma junção de esforços para criar um cluster regional visando a redução de custos, incremento da produção e estimulando o poder de competitivo na região.
Está em debate a criação de um cluster, que deve integrar prefeituras, produtores rurais, indústrias e instituições públicas. Algumas instituições têm apresentado propostas como:
Construção de um porto no rio Caí para reduzir o custo de transporte até o porto de Rio Grande.
Criação de escolas técnicas e de suporte para produção de pesquisa acadêmica direcionada à  produção de alimentos.
Asfaltamento de mais estradas rurais.
Desenvolvimento de biodigestores para gerar energia e fertilizante a partir dos resíduos de aviários e pocilgas.
Expansão da rede de energia trifásica no interior dos municípios.
Ampliar o apoio público à implantação de aviários e pocilgas para famílias locais.

Observações finais
Em vinte anos, Tupandi transformou-se de uma situação de pobreza (renda per capita de 700 dólares), a um nível de prosperidade semelhante à da Coréia do Sul (renda per capita de 22 mil dólares). O mesmo tipo de estratégia administrativa para o desenvolvimento pode beneficiar comunidades similares ao redor do mundo. O fenômeno ocorrido em Tupandi é uma evidência de que isto é possível.

* Livro publicado em 2005

Texto de Daniel Fink

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