sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

1053 - Miro, Guido e Liro: fazendo música para o povo

Um trio que fez história na música de bandinhas


Assim que tomou a gaita nas mãos, Guido Júlio Kercher, surpreendeu. Afinal, ouvir uma música do Mamonas Assassinas sendo tocada e cantada afinadamente, com perfeição, por um homem de 75 anos é, no mínimo, curioso. Vendo a cara de espanto, Guido foi logo emendando: “De velho tenho apenas a idade”, e continuou tocando.
E é assim a vida deste cidadão, que já foi dono de salão de baile, comerciante e músico. Contudo não é possível contar a história de vida deste gaiteiro sem fazer menção à relação de amizade com Almiro Ignácio Mombach. 
 Amigos desde 1955, Miro e Guido são personagens de uma mesma história nascida na metade do século passado. Em 1956, os dois rapazes começaram a tocar juntos, mas jamais imaginaram que fariam música profissionalmente. “Eu não queria ser músico, mas comerciante. Acabei como músico”, sorri Miro, lembrando das primeiras apresentações.
“Meu pai tinha salão de baile e um dia pedi pra ele que me deixasse tocar. Ele aceitou. Mas só se eu tivesse mais gaiteiros comigo. Arrumei um parceiro e começamos a tocar às 18h, mas o outro logo cansou e eu tive que tocar sozinho até às seis da manhã do outro dia”, diz Miro, lembrando que passou dois dias praticamente sem caminhar. 
Já naquela época Guido começou a fazer parceria com o amigo, sendo responsável pelo ritmo da banda. “A gente tocava no meio do público, tomava cerveja, se divertia, e cansava muito. Mas éramos felizes”, aponta Guido, lembrando ter tocado muitos bailes. Guido sorri e diz que muitas vezes as pessoas gritavam “spiel eine limpa banco”, e eles aceitavam ao desafio tocando alguma música animada que fazia todos levantarem dos bancos e rumarem para a pista de danças. 
Nascia daí a vocação de formar novos músicos, tanto que dezenas deles podem se orgulhar de dizer que aprenderam o ofício de tecladista e gaiteiro com Miro. Com dom de maestro, Miro formou uma banda. Claro, mantendo a parceria com Guido, e outros amigos. Ia-se o ano de 1968 e nascia o Tupã Som. 
Nos anos seguintes, o grupo foi a um estúdio, gravando quatro long plays. Seria como ir ao estúdio nos dias de hoje e gravar quatro CD’s, de grande sucesso. “Em três semanas vendi mil discos”, lembra Miro. O número pode não ser expressivo nos dias de hoje, mas levando em consideração a quase inexistência de aparelhos de som e o custo caro de um disco (algo em torno de R$ 20,00 nos dias de hoje), a vendagem era espantosa. E mais: gravar um disco não era para qualquer banda, pois todos os músicos tinham que tocar juntos, dentro do estúdio. “Se alguém errasse, tinha que fazer tudo de novo”, lembra Miro. Guido recorda que um dos discos que foi gravado em São Paulo. E foi esse, de 1977, com o título Oh Du Schöne Welt que alcançou o maior sucesso. Os tempos se passaram e a banda foi desfeita, tendo, deixado forte marca na música de bandinha. Afinal, foi a primeira a introduzir instrumentos como guitarra e contrabaixo no palco.
“Para nós, em casa, era complicado lidar com a ausência do pai, pois ou ele tava trabalhando no comércio ou tocando”, diz Mano Kercher, hoje prefeito de Tupandi. Ele recorda que Guido, mesmo ausente de casa em muitas horas do dia, era um grande pai, que motivava a todos a serem pessoas de boa índole. Quanto a ter veia musical, que poderia ser uma herança do pai, Mano desconversa, dizendo que preferiu a bola à gaita. “Escolhi jogar futebol, até porque não conseguiria tocar com ele e os seus amigos”, sorri o prefeito e fã incondicional da banda.
Nasce um trio
Convidados a tocar em uma festa da Amora, na cidade de Feliz, Miro e seus amigos, trataram de ir ao parque com os seus teclados. Na época, o grupo era formado por Miro Mombach, Liro Heckler e Milton Boesing, sem a presença do camarada Guido Kercher. Liro, que era ainda um jovem aprendiz, aceitou tocar no parque. Afinal, seriam apenas coadjuvantes, tocando no pórtico de entrada do parque. “Lá no meio da tarde eles nos avisaram que iríamos tocar no palco principal, pois uma banda não viria. Aceitamos, mas nem sabíamos o que tocar apenas com os nossos teclados”, sorri Liro, apontando para Miro, que completou a história. “Os Paquitos da Xuxa eram atração naquele dia. Eles se apresentaram e depois era a nossa vez, pra fechar a festa”. De acordo com Liro, a primeira música apresentada foi uma valsa e a pista encheu. “Agradamos e ganhamos coragem pra continuar”, cita Heckler.
Por percalços da vida, o trio inicial foi desfeito e Guido passou a integrar o grupo, no lugar de Milton. Ficava formado Musical Tupan, que mais popularmente é conhecido como Miro, Liro, Guido. “Dizem assim pra rimar e gostamos disso”, sorri Guido, sempre cheio de histórias para contar.
Tocando juntos desde o final do século passado, os três são atração em muitas festas, não apenas no interior, dando show de humildade e carisma. “A gente não deve tocar o que gosta, mas o que o público quer ouvir”, diz Guido tendo a concordância dos demais.
Ecléticos, Miro, Liro, Guido, agradam onde quer que passem, tendo um bom número de fãs. “Tem dia que o braço dói de tantos apertos de mãos e felicitações que recebemos”, comenta Guido. Aposentados profissionalmente, jamais da música, Guido e Miro, adoram a convivência nos palcos e fora deles. Liro, que é gerente de loja, sempre que pode está com a dupla, ensaiando, apresentando-se, ou convivendo em clima intensamente fraternal.
“Não corremos atrás de contratos, mas sempre temos onde tocar e nos divertir”, finaliza Miro, sendo complementado pelos amigos que afirmam que “a maior diversão está em fazer os outros felizes”.
Texto de Alex Steffen

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