terça-feira, 13 de maio de 2014

4010 - A cidade terminava na rua Santos Dumont

Nesta foto, do ano de 1967, vê-se que as ruas Capitão Cruz, Capitão Porfírio
e Bento Gonçalves terminavam na Santos Dumont e o mesmo acontecia com
a João Pessoa. As ruas Coronel Antônio Inácio e Assis Brasil continuavam,
mas não eram pavimentadas. Ao fim da rua Capitão Porfírio vê-se uma elevação
que na época era conhecida como Colina. Hoje, é o bairro Rui Barbosa
NOS TEMPOS DE GURI
Das ruas perpendiculares ao rio, até o final dos anos 60, praticamente só a Ramiro Barcelos estava aberta acima, em direção aos Pinheiros. Na Capitão Cruz havia o Campo do Operário, logo depois da Santos Dumont. A Capitão Porfírio, João Pessoa e a Coronel Antônio Ignácio acabavam nos trilhos da Viação Férrea. O pessoal que morava no atual Bairro Santo Antônio até a Esquina da Sorte e mais além, para virem ao Centro tinham que se deslocar pela Ramiro. Por isso era uma rua muito movimentada.
Aqueles que trabalhava no Frigorífico Renner, de manhã cedo, desciam a Ramiro, caminhando e batendo os tamancos com força no passeio público. Naquele tempo usava-se muito tamanco e os funcionários da fábrica do Renner usavam tais calçados quase à unanimidade. Como não havia bota de borracha, o tamanco era o melhor calçado para enfrentar o piso úmido. O barulho que faziam batendo os tamancos era grande e acordava o pessoal do centro. Normalmente os quartos de casal eram contíguos à calçada. O pessoal se reunião e foi falar com o seu Gaspar. Revestiram as cepas com solado de pneu e o barulho acabou.
Da esquina do Hotel Montenegro até a Santos Dumont, na referida artéria, poucas eram as casas comerciais estabelecidas. Na sua quase unanimidade e dos dois lados da rua, as casas destinavam-se a residências familiares. Por isso havia um número muito grande de guris e gurias que ali moravam.
No passeio público havia solução de continuidade, restando um chão batido muito regular e liso. Nestes espaços os guris jogavam bolinha, principalmente triângulo e boco. Nas calçadas o jogo de bola corria frouxo, de preferência golo-a-golo e cabeça. As meninas jogavam sapata, faziam roda e passavam anel. A presença da juventude acontecia mais para o fim da tarde. Praticamente todos estudavam no São João ou no Colégio das Freiras e as aulas aconteciam em dois períodos. O da tarde acabava às 3h30min e, depois do café, tinha que se fazer os temas para casa.
Depois das 18 horas a rua ficava florida de crianças e adolescentes, especialmente no tempo quente. Era chegado o horário de brincar de esconder. Uns 10 ou mais guris espalhavam-se pela rua, subindo em arvores (havia muitos cinamomos nas áreas fronteiras das casas), escondendo-se atrás dos muros e muitos atravessando atalhos e saindo nas outras ruas.
Nos sábados de verão acontecia uma brincadeira muito sapeca – era uma sacanagem contra os transeuntes que vinham para o centro. Muitos vestidos com fatiota branca, de linho (era o máximo em matéria de vestimenta masculina). Já escuro, enchia-se uma latinha com água, que era amarrada com um cordão fino. Os postes eram poucos e a luminosidade vinda de lâmpadas comuns. Certos lugares eram bastante escuros e ali se colocava a latinha sobre o muro e puxava-se o cordão até a sarjeta, onde era fixo numa pedra. O cordão ficava retesado.
Quando o cidadão descia a rua, ao passar pelo local, empurrava o cordão e emborcava a latinha, entornando a água por sobre si. Imaginem a gritaria, tanto do infeliz passante, quanto da gurizada. Imediatamente todos desapareciam e o coitado ficava a xingar e rogar pragas. 

Crônica de Ernesto Arno Lauer publicada no jornal O Progresso

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