terça-feira, 23 de outubro de 2018

5434 - Racismo e crueldade

.João Bertoldo Rambo, com Pio e Bere, no dia do noivado 

























A única vez em minha vida que vi meu pai dar um tapa na orelha de alguém, foi quando estávamos sentados num bar perto de casa. Eu era criança, e todo dia um de nós irmãos acompanhava o pai até o bar, sentava com ele, e enquanto tomava lentamente aquele martelinho, compartilhava sua história, suas vivências e ia construindo dentro de nós o sentido de verdadeiros cidadãos. 
Pois, naquele dia, sábado de tardezinha, o único negro de nossa vila, pai de família com vários filhos, chegou no bar e o pessoal começou a pagar trago para ele, para embebedá-lo. Quando ele já estava alegrinho, começaram a enfiar gelo em suas calças, que deslizava até os pés. O pai já tinha se incomodado com isto e falou pra mim que este ato repulsivo pelo simples fato de o homem ser negro era completamente condenável.
Quando ele estava mais bêbado ainda, pelos pagamentos de martelinhos da turma e enfiando nele goela abaixo, um rapaz na época, pegou um toco de cigarro aceso e enfiou no meio dos dedos do pé do homem, para ver queimar até chegar na pele.
Meu pai levantou onde estava sentado, e deu um tapa tão estalado na orelha do cara que chegou a calar o boteco. Então ele disse em voz alta:
"Nunca faça a uma pessoa o que não quer que façam a você, branquela nojento."
O cara, massageando a orelha vermelha do tapa, foi e tirou o toco de cigarro do meio dos dedos do pé do negro.
Por atitudes como esta, aprendi desde pequeno que pessoas são pessoas, e a gente nunca olha elas por fora e sim por dentro.
Na foto, Meu pai, à esquerda, no dia do meu noivado em agosto de 1981, juntamente com Bere e eu.
Texto publicado por Pio Rambo no seu Facebook

Um comentário:

  1. Historia dolorosa e forte. Felizmente pessoas como seu pai e e Você contribuiem para a mudança dessa mentalidade desumana e monstruosa.

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