terça-feira, 23 de dezembro de 2014

5049 - Deputado Antônio Rosa Flores

Rosa Flores é autor de vários livros sobre Direito do Trabalho
Antônio Rosa Flores: 

“As pessoas tinham mais escrúpulos” 
Natural de Montenegro, Antônio Rosa Flores elegeu-se deputado estadual por duas legislaturas, de 1967 a 1975, pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB). Na Assembléia, integrou as comissões permamentes de Desenvolvimento Econômico e de Serviço Público e Assistência Social. Também foi deputado federal, de 1975 a 1987, e promotor de Justiça. Aos 76 anos, o ex-parlamentar, advogado e autor de vários livros sobre direitos trabalhistas não está ligado hoje a qualquer partido. Na sua opinião, a sociedade mudou bastante e as pessoas, antigamente, tinham mais escrúpulos." Vivíamos uma vida muito acidentada, turbulenta, num certo aspecto, devido à insegurança jurídica e institucional do país, mas eu também não sabia que vivíamos uma vida sem esses escândalos todos que estamos vendo hoje", diz ele.

Como eram as atividades no antigo prédio da Assembléia?
Nós não tínhamos gabinete individual, tínhamos, se não me engano, dois funcionários que atendiam a bancada toda. Naquela época nós éramos 28 do MDB e 27 da Arena. Quando nos transferimos para esse prédio novo a Assembléia tinha por volta de 200 funcionários. Então esse era o panorama. E, nesse quadro, em que tínhamos dois funcionários atrás de uma máquina datilografando algum requerimento, algum expediente mais ligeiro, os discursos proferidos pelos deputados resultavam de pesquisa própria. Não tinha assessoria para essas coisas. Quando viemos para o prédio novo, ganhamos um pequeno gabinete, que para nós foi uma coisa fantástica. Depois criaram a figura de um funcionário, que poderia ser demitido a qualquer hora e que ganhava um salário. Era um boy, não tinha vínculo.

Para a bancada ou para o deputado?
Para o deputado, cada deputado tinha um funcionário desses.

Aumentou bastante o número de funcionários então?
Ah, não tem dúvida. Depois foi crescendo e a realidade é essa que se vê hoje.

O senhor acha que havia necessidade? Foi algo natural?
Não, foi empreguismo puro. Os tempos mudaram, os costumes, a cabeça dos homens, a austeridade foi relegada a segundo plano e hoje nós temos esse quadro de milhares de funcionários e verbas sem fim. Se não tem lugar para funcionário, criam a figura de um assessor pelos municípios. Uma situação muito maluca. Vou lhe dizer: 55 deputados são os mesmos sempre. E por aquela Assembléia passaram figuras que se projetaram na vida pública brasileira e na administração com essa assessoria que eu lhe falei, mínima. O indivíduo tinha que ter o seu cabedal, a sua bagagem, a sua cultura, a sua vocação para o exercício da atividade. Não precisava de assessoria para fazer discurso, para tudo. Não quero me transformar num censor dos costumes. Mas basta olhar esses dois panoramas, cotejar essa realidade que está aí e a que havia há poucos anos. A década de 60 foi ontem. Pelo menos para mim.

A que o senhor atribui toda essa mudança?
Olha, isso tudo foi crescendo. Quando eu deixei a Assembléia para ir para a Câmara, em 1974, o quadro já não era bem o mesmo, criaram muitos cargos na bancada, de ambos os partidos – que eram dois. Mas o deputado, ao que me parece, tinha um assessor só no gabinete. Eu não sei em que circunstâncias e como isso foi crescendo.

A política mudou?
A sociedade toda mudou. O imediatismo, o pragmatismo, essa ânsia de poder e de riqueza. Isso é inerente ao tipo de desenvolvimento que tivemos, a esse capitalismo todo. O Brasil é outro. Mas foi muito negativo isso. Lá na Câmara, onde eu fiquei 12 anos – estive há pouco tempo lá - é uma coisa impressionante. Nem nos corredores, que eram amplos, na construção daquele prédio moderno... Parece um mercado persa, tem gente para tudo.

O senhor poderia falar um pouco da sua trajetória, de como entrou na política?Eu vinha de São Leopoldo, onde eu exercia a minha profissão de advogado.
O senhor é de Montenegro?
Sim, de Montenegro. Mas me elegi vice-prefeito, em 1963, pelo MTR em São Leopoldo. Foi a última eleição em que o vice-prefeito pôde se eleger por uma sigla diferente daquela do prefeito. Não era vinculado. Eu me elegi numa coligação de partidos em que entrava o PSD - o prefeito que se elegeu era do PSD - e a chapa que se nos opunha e que vencêramos, era do PTB, o partido do Brizola. Então eu me elegi vice-prefeito em 1963. Em 1966, quando saiu a eleição para deputados, já tinha havido a extinção dos partidos, porque a revolução já tinha surgido e terminado com os partidos antigos. Em 1968, em 13 de dezembro veio o AI-5. Em 1966, já tinha os dois partidos novos criados: MDB e Arena. O AI-5 nos cassou nove deputados estaduais e nós, que éramos maioria na Assembléia, ficamos minoria. Tínhamos feito dois presidentes de Assembléia, porque o mandato era de um ano. Tínhamos eleito no primeiro ano o Carlos Santos, que foi quem fez a transferência da Assembléia para o prédio atual, e o sucessor dele, Valdir Lopes, que até era primo do Costa e Silva, mas era nosso deputado, eleito por Lajeado, com votos no Vale do Taquari. Aí adveio o AI-5 como pretexto a um Estado anárquico que eles diziam que estava havendo com estudantes em greve e coisas assim. Fui para a Câmara e fiquei de 1975 a 1987, quando terminou meu último mandato.

O senhor ficou na Assembléia de 1967 a 1975?
Sim, e na Câmara Federal por três mandatos consecutivos, de 1975 a 1987. Essa é a minha passagem pelos legislativos. Depois voltei já me aposentando como promotor de Justiça, porque eu tinha feito concurso para o Ministério Público em 1963 e era promotor de Justiça. Fiquei até 1966, quando me desliguei para ser candidato a deputado estadual. Fiquei desligado até o fim, quando eu tinha tempo de serviço público para a aposentadoria.

Quais eram os grandes debates naquela época que o senhor se recorda?
Eram institucionais e políticos os grandes debates. Na área política, a respeito da normalização da vida política do país, do regime de exceção.

Em seu primeiro mandato como deputado estadual.
Foi tão fugaz, porque se iniciou em 1966, logo depois o regime ressurgiu com o AI-5, mas o tema político sempre foi o que empolgou. No plano social, havia o problema da reforma agrária, os problemas ligados ao inquilinato. No bojo desses temas, o Alceu Collares se elegeu deputado federal. Mas eram esses os temas que me constam.

Quais são suas atividades hoje?
Só cuido de coisas pessoais. Poucas que tenho, algum imóvel.

Nada ligado à vida pública?
Não, até estou desligado partidariamente. Não tenho partido político.

O senhor lembra de algum episódio pitoresco ou marcante do tempo de deputado?
Não me aflora à lembrança nada. Vivíamos uma vida muito acidentada, turbulenta, num certo aspecto pela insegurança jurídica, institucional do país. Mas eu também não sabia que vivíamos uma vida sem esses escândalos que estamos vendo hoje.

O senhor acha que havia mais honestidade?
Havia, as pessoas tinham mais escrúpulos. É aquilo que lhe falei da sociedade, que se modificou – para pior.


Entrevista de Marinella Peruzzo realizada em 8 de janeiro de 2008, com Edição de  Jussara Marchand
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